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Violência no Equador é reflexo de aprofundamento neoliberal, diz socióloga

11 de janeiro de 2024

Para entender as origens da onda de violência que assola o Equador, é preciso observar as diretrizes políticas e macroeconômicas tomadas por quem governou o país no passado recente. Elas revelam que o retorno ao neoliberalismo, em 2017, e seu aprofundamento desde então são a principal causa da capilaridade obtida pelo crime organizado, segundo avaliação da socióloga equatoriana Irene León.

Desde que o ex-presidente Lenín Moreno (2017-2021) assumiu o poder, com uma plataforma neoliberal, o Equador está afetado por uma incursão do crime organizado, que encontrou vários nichos de atuação, num processo que contou inclusive com a participação de integrantes da elite política, explica a socióloga ao Brasil de Fato.

“A incursão desses atores em capitais ilícitos e outros setores do crime organizado está proporcionalmente relacionada com o desmonte do Estado e a suspensão de instituições como o Ministério da Justiça, além da supressão das políticas de segurança interna que operam como parte do processo de aprofundamento neoliberal associado à redução do Estado”, afirma León.

Nesses seis anos de neoliberalismo, o país deixou de ser o segundo mais seguro da América Latina para se tornar um dos mais inseguros do continente, e inclusive do mundo. Na avaliação da socióloga, tal fato coloca em evidência que as lógicas do mercado “não resolvem nada, pelo menos no tema da segurança”.

“A substituição da segurança interna soberana por uma estratégia securitista de mercado que está sobre a mesa agora, que implica na privatização da segurança, é parte central do problema que o país está vivendo há tempos e que agora assume um perfil delicado”, diz ela.

O presidente Daniel Noboa, que havia decretado estado de exceção e toque de recolher na segunda-feira (8), restringindo assim direitos dos cidadãos, reforçou a decisão nesta terça (9) ao declarar estado de conflito armado interno em nível nacional e ordenar às forças militares a neutralização de grupos criminosos. Além disso, decretou que 22 grupos do crime organizado transnacional sejam considerados organizações terroristas e atores não estatais beligerantes.

Irene León chama atenção para o fato de o governo ter categorizado como terrorismo o crime organizado e outros crimes que geralmente são do âmbito penal e não político. “Há uma preocupação pela aplicação desse conceito e pelo modo como se inter-relaciona com as palavras narcoterrorismo ou narcopolítica, que podem gerar confusões num país que já está sendo afetado por um intensivo lawfare (perseguição política por meio de mecanismos judiciais) há mais de seis anos.”

Geopolítica e soberania

A socióloga equatoriana aponta ainda outro fator fundamental, de caráter geopolítico, para entender as raízes da crise de segurança: o projeto hemisférico dos EUA e seu plano específico na região andina.

“No ano passado, os EUA e o Equador assinaram um acordo de cooperação militar muito amplo, que inclui a eventual presença de tropas dos EUA no Equador. Além disso, em dezembro de 2022, foi assinada nos EUA uma lei de cooperação que inclui diferentes aspectos relacionados com a governança no Equador. Aí esta incluída a questão de segurança interna, mas também os temas de relações internacionais”, conta a socióloga.

Como sinais desse estreitamento de laços, ela aponta que, nos últimos anos, a política externa equatoriana tem atuado “completamente alinhada” com a política estadunidense. “Nos últimos dias, o governo dos EUA ofereceu uma cooperação imediata para resolver o que estamos atravessando, de modo que eu não me surpreenderia com qualquer cooperação dos EUA para resolver o problema que estamos atravessando, com tropas ou qualquer outra coisa, violando não só a Constituição do país mas também a tradição política latino-americana e do Caribe de ser uma zona de paz.”

Desigualdade e pobreza

A Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), principal organização indígena equatoriana, também culpa as políticas neoliberais pela crise. Em nota, a entidade diz que existe um problema estrutural, “originado pela radicalização de políticas neoliberais que têm destruído o Estado e suas instituições, deixando-as sem capacidade de resposta”.

“Essas políticas também têm gerado mais desigualdade e pobreza, criando condições sociais propícias para o recrutamento de jovens por parte do crime”, afirma a Conaie, que liderou os últimos levantes populares contra medidas dos governos de Lenín Moreno, em 2019, e Guilhermo Lasso, em 2022.

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