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Reservas externas não são antítodo à forte deterioração dos fluxos comerciais e de serviços

22 de abril de 2010

As transações brasileiras com o exterior em 2010 serão novamente deficitárias e em maior proporção. Esta é a previsão do Banco Central, para um déficit em Conta Corrente em dobro daquilo que fora em 2009, estimado agora para 50 bilhões de dólares. Este resultado poderá ser mais negativo ainda se houver crescimento econômico maior que o previsto (ao redor de 5,5.

Deve-se recordar que este é o terceiro ano consecutivo de “déficits” externos (28,2 bilhões em 2008; 24,3 bi em 2009; projetados 50 bi para 2010), depois de cinco anos de aparente equação do desequilíbrio externo (2003-2007), quando o país se lançou em uma estratégia de forte “primarização” do seu comércio externo e também experimentou retorno dos fluxos de capital estrangeiro, abalados depois da grave crise cambial de 1999.

De agora em diante, a situação requer um enfrentamento algo diferente do padrão que temos seguido no passado recente. O governo FHC I (1995/1999) promoveu uma verdadeira farra cambial; provocou déficits cumulativos e crescentes nas Contas Externas durante todo o primeiro mandato, sustentados por ingresso de capital estrangeiro de curto prazo e pela privatização de ativos estatais. Não escapou em início de 1999 de uma grave crise cambial, que deixou o país por quatro anos de ‘pires na mão’, solicitando sucessivos empréstimos ao FMI. Tudo isto se deu em um clima de euforia eleitoral, tanto assim que o presidente Fernando Henrique Cardoso se reelegeu em outubro de1998 ainda no primeiro turno.

Atualmente ocorre uma aparente repetição desse passado recente naquilo que se refere ao desequilíbrio externo, sem que a opinião pública e setores influentes das mídias, do empresariado e da burocracia estejam alertados e prevenidos para as conseqüências da continuidade e agravamento do déficit externo.

‘Déficits’ continuados e crescentes nas Contas Externas não são sustentáveis. O mecanismo compensatório de contrair dívidas externas ou atrair capital externo para solvê-los cobra um preço muito alto em dependência externa. A história recente do país mostra que essas situações se encerram com graves crises de insolvência cambial (ver 1982 e 1999), com conseqüências graves de estagnação econômica.
Reservas Internacionais “altas”, de que tanto se jactam nossos dirigentes econômicos, diga-se de passagem, formadas devido aos elevados fluxos recentes de capital estrangeiro, não são antídoto adequado face à deterioração continuada dos fluxos comerciais e de serviços, que praticamente explicam 900as Transações Externas.

A solução conservadora de fomentar a qualquer custo as exportações primárias, experimentada com relativo sucesso entre 2000-2007, não resolve o desequilíbrio estrutural das contas externas. Estas estão contaminadas por um gigantesco déficit de Serviços cujo principal componente é precisamente o serviço de remuneração do capital estrangeiro, que tem afluído mais intensamente no último qüinqüênio.

Há tempo, embora não muito largo, para soluções inovadoras. Não será no atual governo, cujos dirigentes estiveram essencialmente comprometidos com a prática da inserção primário-exportadora e com a máxima abertura ao capital estrangeiro. Tampouco os dirigentes econômicos dos governos FHC I e FHC II têm lições sábias de política cambial a oferecer.

A experiência histórica ensina que confiar na “mão invisível” dos mercados face à continuada deterioração das transações externas conduz a graves crises de insolvência cambial, das quais apenas alguns bandidos escapam ilesos e ainda mais ricos. O país como um todo afunda em tais situações.
Infelizmente não há na opinião pública consciência da gravidade da situação, conformada que está sobre uma pretensa superação da dependência externa. Por sua vez, o tratamento ultra-cifrado das questões cambiais pelo lado estritamente técnico e conjuntural não ajuda a esclarecer sobre a necessidade de um projeto alternativo de relacionamento financeiro com exterior. Fica, por ora, o alerta para futuros questionamentos.

Fonte: Guilherme Costa Delgado é doutor em Economia pela UNICAMP e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz

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