MPT vai investigar Lojas Colombo, acusada de forçar funcionários que perderam tudo a retomarem o trabalho. Mesmo sem casa ou com ruas alagadas
A Lojas Colombo, maior rede varejista do sul do país e com sede em Farroupilha (RS), está sendo acusada de pressionar seus funcionários a voltarem ao trabalho — mesmo aqueles afetados pela tragédia sem precedentes e impossibilitados de se locomover.
O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul recebeu denúncias e abriu uma investigação sobre o caso, ainda em fase preliminar.
O ICL Notícias também recebeu diversas denúncias de trabalhadores que estão se sentindo ameaçados de perder o emprego caso não voltem ao trabalho nas lojas e centros de distribuição da rede, que vende sobretudo móveis e eletrodomésticos.
Segundo as denúncias, quem procura os funcionários são profissionais do setor de Recursos Humanos da empresa e também supervisores de área.
Em um dos casos, um funcionário de Canoas, cidade destruída pela catástrofe, disse estar sofrendo “pressão psicológica para voltar”.
Quando a água começou a invadir sua casa, ele teve tempo apenas de sair com sua mãe e irmã, todos levando a roupa do corpo, às 4h da madrugada.
“Existe uma pressão psicológica. Eles disponibilizaram ônibus em determinados pontos para buscar os funcionários e exigem que a gente aceite. Mas o ponto mais perto da casa onde estou fica a 1h30 de distância a pé, e o único jeito de chegar até o ônibus é caminhando”, contou.
Em outra denúncia, uma funcionária conta que uma mulher do RH de Farroupilha teria dito que já estavam operando normalmente.
“Respondi que os ônibus não estavam entrando aqui. Ela perguntou se eu conhecia o mercado Ideal. Disse que moro a 4 km de distância do mercado, onde eles estavam disponibilizando ônibus. Eu disse que daria 4 km se não estivesse tudo alagado. Como está, seriam 14 km de caminhada até chegar ao ônibus. Não tem como ir”, afirmou. “Só se a gente for de barco.”
Segundo uma das denúncias, os funcionários se ressentem da forma como estão sendo tratados.
“Eles estão pouco se lixando para quem foi afetado. Não querem ajudar as pessoas que perderam tudo. Só querem que a gente volte a trabalhar”, diz um empregado em um dos áudios.
“A gente não tem culpa pelo que aconteceu”
“O certo seria as pessoas voltarem quando for possível. A gente não tem culpa pelo que aconteceu”, desabafou outro funcionário.
Uma funcionária recusou-se a trabalhar nessas condições, mesmo com medo de represália.
“Disseram que iriam me trazer algumas doações, mas nada apareceu. Não tenho condições de ir para lá”, disse. “Se me derem uma casa mobiliada, onde eu possa deixar meus filhos em segurança, e também um jetski, eu vou trabalhar.”
“De repente tirar férias?”
Em dois áudios, um homem que seria supervisor da empresa fala com subordinados, sugerindo que eles usem suas férias caso não possam voltar a trabalhar agora.
“Como é que você está psicologicamente, até questão de logística também? Sei que você não está na sua casa… A gente vai começar a trabalhar, tá? [Você] está 100%, está tranquilo, dá para voltar a trabalhar? Estamos avaliando o que vamos fazer com o pessoal que está fora de casa. Vai demorar alguns dias para baixar a água em Canoas. Queria ver o que é melhor para ti. Voltar a trabalhar? De repente tirar férias? Tá bom? Te aguardo”, indaga.
Um dos trabalhadores, também da cidade de Canoas, afirma que recebeu da Lojas Colombo os seguintes itens:
“Água, um colchão de solteiro, 100 sanduíches, 13 marmitas, um saco com roupas e uma boneca de pano. É tudo que a empresa fez por mim”.
Segundo um dos empregados, que também pediu anonimato, “o que a empresa está fazendo é desumano”.
A Lojas Colombo tem mais de 300 lojas no Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. Ela é a maior rede varejista do Sul e a décima maior de todo o país.
A empresa foi fundada pelo empresário Adelino Colombo, que morreu aos 90 anos de idade em 2021, quando atuava como presidente do Conselho Administrativo. Ele foi sucedido no grupo por um dos netos, Carlos Eduardo Colombo, até então vice-presidente da companhia.