Nova classificação da OMS reconhece burnout como fenômeno ocupacional e reforça a responsabilidade do ambiente profissional.
Durante muito tempo, o trabalho foi sinônimo de esforço e sacrifício. Mas essa visão simplifica um tema mais complexo. O ambiente profissional, quando bem estruturado, organiza a rotina, fortalece vínculos, desenvolve talentos e oferece sentido à vida. É no trabalho que muitos constroem identidade, criam laços e encontram propósito.
No entanto, esse mesmo espaço pode gerar riscos quando dominado por cobranças excessivas, insegurança emocional ou ausência de apoio. Por isso, o debate sobre saúde mental nas empresas precisa sair do discurso e entrar na prática. A falta de cuidado com o emocional afeta diretamente a produtividade, o clima interno e a sustentabilidade do negócio.
Propósito e rotina para todas as idades
A ruptura com a atividade profissional pode desestabilizar jovens e idosos. No Brasil, o suicídio já é a terceira causa de morte entre pessoas de 10 a 24 anos, segundo o Ministério da Saúde. Já a Organização Mundial da Saúde aponta que 27% das mortes por suicídio no mundo ocorrem em pessoas com mais de 60 anos.
Em muitos casos, a perda do propósito está ligada à saída forçada ou definitiva do mercado de trabalho.
O trabalho é mais que obrigação. Ele estrutura horários, dá sentido aos dias e constrói autoestima. É também espaço de afeto, de convivência e de formação de vínculos. Discutir saúde mental no trabalho é falar sobre identidade e dignidade.
Sofrimento emocional tem sinais físicos
Ambientes profissionais com baixa segurança psicológica estão entre os principais gatilhos de sofrimento emocional. O medo de errar ou de ser punido cria um ambiente silencioso e adoecedor.
Sinais físicos como insônia, gastrite, tensão muscular, dor de cabeça e queda de cabelo surgem como sintomas da sobrecarga emocional. Esses sintomas indicam que o corpo entrou em alerta constante, sem tempo de recuperação.
Segundo o Censo de Saúde Mental da Vittude, 31% dos profissionais brasileiros estão em presenteísmo — ou seja, estão fisicamente no trabalho, mas sem condições emocionais para produzir.
Acidente de trabalho pode ser psicológico
Mesmo com impacto comprovado, o sofrimento emocional ainda é pouco discutido no ambiente corporativo. Burnout, ansiedade e depressão também afastam e invalidam — mas continuam sendo tratados como questões individuais.
Esse cenário começa a mudar com a chegada do CID-11 ao Brasil em 2027. A nova classificação inclui o burnout como fenômeno ligado ao trabalho, obrigando empresas a adotarem ações preventivas.
A Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), atualizada em 2024, já caminha nesse sentido. Ela determina que os riscos psicossociais sejam mapeados e acompanhados, com escuta ativa e plano de ação. O foco deixa de ser a punição e passa a ser a proteção.
Cultura de cuidado
Oferecer ambientes emocionalmente seguros deixou de ser diferencial. Hoje, é compromisso. Isso inclui preparar lideranças, revisar metas desproporcionais, garantir equilíbrio entre esforço e recompensa, respeitar limites e incentivar relações saudáveis.
A saúde mental precisa ser parte da estratégia de gestão. Isso significa criar políticas claras, canais de escuta confiáveis e indicadores que orientem as ações.
Como resume Tatiana Pimenta, CEO da Vittude: “Não existe EPI contra a humilhação, mas existe liderança preparada, cultura segura e empresa que entende que prevenir não é custo — é compromisso.”