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Polícia nas escolas não evita ataques e pode introduzir outras violências

Fernando Frazão/Agência Brasil

17 de abril de 2023

Especialistas defendem soluções dentro do campo da educação para controlar agressões. As pessoas mais capacitadas para fazer uma estratégia preventiva são os professores

A adoção de medidas de segurança ostensiva para o controle de episódios de violência contra escolas está na ordem do dia no Brasil. Após duas semanas em que o medo e o pânico dominaram as unidades escolares do país, com a ocorrência de dois ataques com mortes e pelo menos quatro agressões com feridos, a resposta de diversos estados vem sendo aumentar a polícia nas escolas.  

Em Santa Catarina, estado que sofreu com o mais violento dos ataques, que resultou na morte de quatro crianças, o governador Jorginho Mello (PL) anunciou que haverá um policial armado em cada escola da rede estadual. Em São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou que as escolas poderão contratar segurança particular desarmada e que haverá, também, um policial em cada unidade. Outros anúncios do mesmo tipo estão em curso em todo o país. 

Mas, infelizmente, isso não devem funcionar. Especialistas em segurança e educação concordam que a presença de forças de segurança em escolas não controla a ocorrência de ataques contra alunos e professores. Pior: eles afirmam que, além de não impedir as agressões, a presença de policiais na escola pode piorar o ambiente escolar. 

“As pessoas imaginam que com um policial estarão mais tranquilos na porta da escola”, diz Bruno Langeani, diretor de projetos do Instituto Sou da Paz. Para ele, no entanto, isso traz apenas uma falsa sensação de segurança. E dá exemplos, daqui e de fora.

“Os Estados Unidos são o melhor lugar para gente olhar isso: é onde se investiu fortemente em detector de metal, policial armado e outras medidas mais de segurança estrito senso e isso não funcionou. Inclusive, a gente teve massacres em escolas com um policial armado”, lembra. Uma escola com gestão compartilhada com a PM em Barreiras, na Bahia, também foi alvo de um ataque a tiros, em setembro de 2022.  

Para Marcele Frossard, socióloga e integrante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a comparação com os EUA é evidente e elucidativa. “[Nos EUA] todas essas medidas foram incentivadas e já acontecem, e isso não tem evitado ataques nas escolas”. 

Frossard afirma que a insistência no policiamento como solução para os ataques reflete a tentativa de criar respostas imediatas para problemas complexos. “A gente recomenda uma discussão profunda da sociedade civil, do Estado, das forças policiais, dos especialistas de uma maneira geral tanto da segurança pública quanto da educação, quanto de outras áreas como de segurança sobre o tema. Infelizmente a gente não tem uma solução instantânea”, diz.  

Antieducacional 

A presença de polícia ou vigilância nas escolas não é uma ação neutra. Além de não conter ataques, forças de segurança influenciam nas relações estabelecidas nas escolas, pioram o ambiente escolar e podem, inclusive, colaborar para o aumento de outros tipos de violências. 

“A gente entende que isso [foco em artefatos de segurança e policiamento] não é eficaz para enfrentar o extremismo de direita que a gente observa como sendo um dos principais fatores relacionados a esses ataques. Na verdade, a gente imagina que isso pode aumentar essas ameaças, porque vai tornar o clima escolar insalubre e a escola um espaço ainda mais relevante em termos de propaganda extremista”, afirma Frossard. 

“Quando falamos de clima escolar, estamos falando desse contexto em que o ambiente da escola se torna tenso, e os professores e alunos se sentem silenciados”, explica. “É importante assegurar que esse ambiente escolar seja saudável, acolhedor e que promova a criação, a criatividade e a criticidade, para que essa educação seja crítica, inclusive da mídia e dos espaços que essas crianças e adolescentes participam, online principalmente”, acredita Marcelle. 

Abuso policial

A presença de policiais nas escolas pode também fazer com que conflitos comuns cresçam e virem casos de polícia. “Se você tem um policial na escola, qualquer tipo de conflito vira caso de polícia, quando nem sempre é.”

“É natural que a gente tenha brigas de adolescentes, conflitos, e se a gente tem essa estrutura disponível, vai recorrer a ela, então a gente acaba policializando vários problemas que são de natureza da esfera escolar”, afirma Langeani. 

Além disso, são comuns denúncias de casos graves de violência contra alunos em escolas cívico-militares, em que a presença de policiais é constante.

“A gente tem essa experiência das escolas cívico-militares, com a administração da educação feita por policiais militares, onde a gente introduz uma série de outros problemas, seja de abusos físicos, de violência, de assédio moral e também de assédio sexual, em especial com as alunas meninas”, lembra o gerente do Sou da Paz. 

“Soluções do muro para dentro”

A melhor maneira de evitar a violência, para Langeani, é agir dentro das escolas. “A melhor estratégia é a que trabalha muro pra dentro e não muro pra fora. As pessoas mais capacitadas para fazer uma estratégia preventiva para evitar esses casos são os professores, trabalhando conteúdo contra conflito para treinar os jovens com mais habilidades socioemocionais, como lidar com frustração, como lidar com desavenças, como trabalhar conciliação e tolerância”, afirma.  

Para além disso, é a comunidade escolar que tem a capacidade de avaliar se há, dentro da escola, alguma ameaça de ataque. O relatório O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação governamental, produzido pelo GT de Educação do governo de transição de Lula, analisou casos de ataques frustrados a escolas nos últimos 20 anos. Na maior parte deles, houve a detecção precoce de sinais por parte de pessoas que conviviam com os alunos que planejavam agressões.  

“É preciso] conseguir ter um processo de aproximação entre a comunidade que permita que você levante alertas futuros, perceba um aluno que está mudando o comportamento, escute denúncias que vêm dos pais dos estudantes sobre falas estranhas que vêm de um aluno, comportamentos agressivos”, afirma.  

Entre os sinais de alerta estão comportamentos violentos, especialmente direcionados contra populações minorizadas (mulheres e meninas, pessoas racializadas ou com deficiência), culto às armas, elogios à ideologias de extrema direita e verbalização do desejo de realizar um ataque do tipo. 

Detecção

Em praticamente todos os casos de ataques contra escolas ocorreram antes sinais que indicavam o que estava por vir.

“O adolescente fala para algum colega que quer cometer, chama algum colega para participar, está comprando artefatos para fazer o uso, então vai comprar itens para fazer um explosivo, vai buscar armas, faz busca [na internet] sobre isso. E muitas vezes posta em redes sociais abertas sobre a intenção de fazer esse ataque”, enumera Bruno.  

“A gente precisa fortalecer essa capacidade de detecção. Como os professores identificam uma mudança de comportamento, como a escola pode dar um tratamento a uma denúncia que veio de um aluno, que veio de um pai para fazer uma apuração sobre a consistência disso”, afirma Langeani. “Tem uma série de mecanismos que ajudam bastante a fazer uma atuação bem antes dessa agressão começar.”

Pensar a segurança pública 

Marcelle Frossard, pesquisadora vinculada ao Laboratório de Análise da Violência da universidade Estadual do Rio de Janeiro (LAV-UERJ), reforça a necessidade de que a comunidade escolar pense e aja de maneira sistêmica contra a violência. “É importante fortalecer os grêmios estudantis, associações de familiares, conselhos escolares como forma de mobilização contra a violência.”

“Incrementar unidades com abordagem emancipadora também é um fator de prevenção porque promovem debates na sala de aula estimulando os alunos a refletirem sobre ideias que têm fundamentado esse ataque.”

“Através da educação a gente acredita que é possível mudar essa ideia, é possível mudar a maneira como essas crianças e adolescentes têm sido estimulados a desenvolverem ideias misóginas, se aproximarem desses grupos extremistas”, diz. 

Para ela, a forças de segurança têm um papel importante na investigação e desmobilização de ataques, mas é preciso pensar nas políticas públicas para a área de maneira aprofundada. “Pensando numa política de segurança pública, o que a gente sabe é que essas etapas são sintomas de uma questão maior”, diz. “O que a gente tem assistido nos últimos anos é uma cultura de incentivo a violência. A gente tem uma segurança pública no país que é difusora e ideias violentas e de uma perspectiva de prevenção à violência muito violenta”, afirma. 

Ela elogia discussões passadas sobre segurança pública que contaram com a presença da população. “Essa reflexão e esse planejamento de políticas públicas através da participação da sociedade servem para entender quais são as demandas.”

Marcelle afirma, ainda, que a garantia de direitos também é uma política de segurança. “Ter uma atenção à saúde, assistência, proteção social, tudo isso são questões que também tão relacionadas à segurança. Segurança não é só a questão das armas e o envolvimento da sociedade pra entender que essas pessoas também são pessoas dignas de direitos”, diz.  

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