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Limitar ganho do salário mínimo ao arcabouço aumenta desigualdade, diz USP

Marcello Casal Jr/Agência Brasil

27 de novembro de 2024

Uma das marcas do terceiro governo Lula é o retorno da política de valorização do salário mínimo. Isto significa que o reajuste deve oferecer ganho real para os trabalhadores, ou seja, as correções anuais ficam acima da inflação. Como exemplo, no reajuste para este ano a correção total foi de 6,97%, repondo a inflação medida pelo INPC (que ficou em 3,85%) e oferecendo mais de 3% em ganho real ao acompanhar o crescimento do PIB. A situação elevou o salário mínimo de R$ 1.320 para R$ 1.412.

Apesar dessa medida, discute-se a limitação do ganho real do salário mínimo às regras do novo arcabouço fiscal, que, se concretizado, pode render ganhos menores aos trabalhadores. O debate acontece no momento em que o governo é pressionado pelo mercado financeiro a apresentar uma alternativa de corte de gastos para o próximo ano.

De acordo com estudo Made (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades) da USP (Universidade de São Paulo), divulgado no site do Centro, a proposta ainda em debate, se concretizada, traria um impacto negativo para o país, uma vez que prejudicaria os esforços para a distribuição de renda com o aumento das desigualdades.

Conforme o estudo, a avaliação é que em troca um ganho fiscal “tais cortes tenderiam a gerar, através da redução do poder de compra de parcela significativa da população, efeitos indiretos negativos sobre o crescimento econômico e, consequentemente, a arrecadação pública.”

Este dado é um alerta para o governo, pois nas últimas apurações registrou recordes históricos de arrecadação. Por isso os pesquisadores alertam que se o governo pretende restringir o ganho real por um lado, irá perder em outro com um possível arrefecimento da economia que traria uma menor arrecadação – por isso a necessidade de sopesar a proposta.

O Made fez a projeção para ilustrar o que pode ocorrer caso vingue uma proposta de limitação do ganho real pelo Novo Arcabouço Fiscal com o piso dos benefícios previdenciários e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) ainda vinculados ao salário mínimo.

Neste cenário a regra para o salário mínimo acompanharia o arcabouçou que prevê a alta na despesa limitada a 70% da receita do ano anterior caso a meta seja fiscal seja atingida (para 2024 a meta é 0 com intervalo de 0,25%) e limitada a 50% caso a meta fique abaixo da banda de tolerância para a meta anual. Além disso, fica estabelecida uma banda de crescimento real que varia entre um piso de 0,6% e um teto de 2,5% ao ano (descontada a inflação).

Assim, o efeito simulado dessa política, se tivesse sido implementada desde o ano 2000, com o máximo de aumento anual de 2,5%, e aplicada as limitações de despesas em 50% e 70%, a desigualdade medida pelo índice de Gini na Previdência Social “ficaria entre 0,546 e 0,549, uma elevação na desigualdade de renda entre 3,2% e 3,8%, e o gasto seria reduzido entre 15,9% e 19,9%, respectivamente”.

No caso do BPC, “o Gini seria de 0,533, um aumento de 0,75%, e a despesa com o programa seria 45,5% menor, uma redução da ordem de R$ 50 bilhões.”

Para efeito de comparação, o Gini atualmente no Brasil em 2024 é de 0,518 e o índice trabalhado no estudo de renda total per capita 0,529. O índice de concentração de renda Gini varia de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo de 1 maior é a desigualdade apurada.

Em outra simulação, caso o BPC – benefício que garante um salário mínimo por mês ao idoso com idade igual ou superior a 65 anos ou à pessoa com deficiência de qualquer idade – fosse atrelado, desde 2020, ao crescimento da inflação ao invés do salário mínimo “a desigualdade de renda no país, medida pelo índice de Gini, seria de 0,534, 0,9% maior do que a atual.”

Da mesma maneira com os benefícios previdenciários, com a regra 70% e 50%, “o índice de Gini se situaria entre 0,555 e 0,552, o que representa um aumento entre 4,2% e 4,8% em relação ao índice atual”.

“Para se ter uma dimensão desse aumento da desigualdade, entre 2001 e 2022, período marcado por uma excepcional redução da desigualdade de renda no Brasil, o índice de Gini caiu cerca de 10,9%. Ou seja, caso o piso previdenciário fosse dado pela inflação observada desde 2000, mais de 40% de todo o avanço na redução da desigualdade no período poderia não ter ocorrido”, traz o artigo publicado Guilherme Klein Martins e João Pedro de Freitas Gomes.

Em todo o caso, é importante salientar que o governo já descartou, de forma categórica por falas do presidente Lula, qualquer desvinculação dos benefícios em relação ao salário mínimo.

No entanto resta saber o que será feito em relação ao ganho real limitado ao arcabouço fiscal, que, conclui o estudo: “não é possível garantir que o efeito agregado de tais cortes sobre as contas públicas será sequer positivo. Por outro lado, uma desvinculação desses benefícios sociais nos moldes aqui simulados terá, invariavelmente, importante efeito negativo sobre a desigualdade de renda brasileira.”

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