Presidente do Banco Central afirma que inflação segue resistente
O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, disse na quarta-feira (27), durante discurso no 33º Congresso da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores), realizado no São Paulo Expo, que a taxa básica de juros, a Selic, deve ficar em patamar elevado por “longo período”, devido à inflação resistente.
“Estamos em um cenário de ter descumprido a meta [de inflação] duas vezes – no final de 2024 e meados de 2025 – e com expectativas e projeções do mercado e do Banco Central que apontam que essa convergência está se dando de uma maneira lenta para a meta de inflação. É isso que tem demandado uma política monetária mais restritiva, que busca justamente fazer essa convergência para a meta”, explicou.
“A Selic é o quanto que o dinheiro se valoriza no tempo. A inflação é o quanto o dinheiro perde valor no tempo. Em um processo de elevação da inflação, você vê a meta escapar e, simultaneamente, ficar menos apertada a política monetária, que deveria justamente estar apertada para perseguir a meta. Por isso tem essa regra de que, quando o Banco Central começa a subir os juros em um processo onde a inflação está subindo, o BC precisa subir mais do que a inflação está subindo. Se a inflação está subindo, significa que a taxa de juros não está restritiva o suficiente para produzir a convergência da inflação para a meta. Se ela não está restritiva o suficiente e está caindo, preciso subir ela mais do que a inflação está subindo”, complementou Galípolo.
Atualmente a taxa Selic está em 15% ao ano. Na última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) do BC, o ciclo de alta dos juros foi interrompido.
A fala de Galípolo converge com o que está na própria ata da reunião do Copom. O documento salienta que o aumento das tarifas impostas pelos Estados Unidos a produtos brasileiros está no radar do Banco Central e que, diante dos efeitos agregados ainda incertos sobre a economia brasileira, a Selic pode permanecer em patamar elevado por mais tempo do que o previsto anteriormente.
No evento, Galípolo lembrou que a convergência da inflação para o centro da meta de 3% segue lenta. Projeções do BC indicam que, mesmo até 2027, a inflação tende a permanecer acima do centro da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional.
Isso significa que os juros altos devem ser mantidos para conter o consumo e controlar os preços, ainda que isso impacte o crescimento econômico.
Efeitos da Selic sobre a economia
Os efeitos da política contracionista já são sentidos em alguns indicadores. O IBC-Br (Índice de Atividade Econômica) do BC avançou 0,3% no período de abril a junho deste ano, uma desaceleração expressiva em relação ao desempenho do primeiro trimestre, quando o índice avançou 1,5%.
Ontem, o Ministério do Trabalho e Emprego divulgou que mercado de trabalho brasileiro registrou um saldo positivo de 129.775 empregos formais em julho de 2025, segundo dados do Novo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). Apesar do crescimento, o resultado indica uma desaceleração de 32% na criação de vagas de empregos formais em relação a julho de 2024, quando o saldo foi de 191,4 mil vagas.
O presidente do BC, no entanto, pontuou que a economia ainda dá sinais de aquecimento. “O que parece ter acontecido é que a renda tem se mostrado bastante resiliente. Estamos com o nível de desemprego mais baixo da série histórica, batendo 5,8%, dessazonalizado 5,7%, que é o menor nível de desemprego da série histórica. E estamos com o nível mais alto de renda do trabalhador. Então, mesmo com uma taxa de juros restritiva, a gente segue mostrando uma resiliência no mercado de trabalho, bastante forte, o que deve estar puxando uma demanda mais forte”, afirmou.
Conforme demonstrado no evento da Fenabrave, o cenário de juros altos preocupa concessionárias e montadoras, que dependem fortemente de financiamentos para alavancar vendas. Com o crédito mais caro e seletivo, o setor sente os efeitos no dia a dia das negociações.
O evento reuniu representantes de mais de 8.000 pontos de venda, que empregam cerca de 350 mil pessoas. Antes da palestra, o presidente da Fenabrave, Arcelio Júnior, apontou a chegada de novas montadoras ao Brasil como oportunidade — desde que haja “isonomia” nas regras de mercado.
Câmbio a favor
Por outro lado, Galípolo destacou o comportamento favorável do câmbio. “O mercado cambial tem se comportado bem, há uma mudança na correlação entre moedas emergentes e o dólar”, afirmou, sinalizando que a valorização do real pode facilitar importações e atenuar pressões de custo para o setor.
De acordo com dados do Banco Central, entre 13 de julho e 13 de agosto, o real se valorizou 3,7% frente ao dólar, superando divisas como o rand sul-africano (+1,8%), o forint húngaro (+1,3%) e o peso chileno (+1,2%). Também tiveram ganhos, mas de forma mais tímida, a libra esterlina (+0,5%), o peso mexicano (+0,8%), o zloty polonês (+0,1%) e o euro (+0,1%).