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Especialistas rebatem justificativa para reforma da Previdência

22 de abril de 2017

Vinte profissionais analisaram cálculos utilizados pelo governo Temer para chegar ao alegado “rombo do sistema previdenciário”, nos quais encontraram erros e omissões.

Mesmo que a Previdência fosse deficitária, o que não procede se contabilizada a contribuição constitucional que o governo deveria ter no sistema de seguridade social, os cálculos apresentados pelo governo Temer do alegado “rombo” estão errados. Essa conclusão é resultado de uma análise minuciosa feita por vintes especialistas em matemática, engenharia e computação.

Em audiência pública da Comissão Especial da Reforma da Previdencia, em 15 de março, o Ministério da Fazenda entregou aos deputados um CD com explicações sobre o cálculo do alegado rombo da Previdência, com previsão de alcançar R$ 202,17 bilhões em 2016 e R$ 10,42 trilhões em 2060. O material foi repassado para especialistas da Anfip (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil), que o analisaram conjuntamente com o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) e com o SindCT (Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial).

Os especialistas desenvolveram um software de checagem de dados e enviaram nota técnica com suas conclusões para a Comissão Especial da Reforma da Previdencia. O site de notícias The Intercept teve acesso à nota e publicou seu resultado: as informações fornecidas pelo governo são insuficientes e não permitem estimar minimamente os impactos da reforma proposta.

“Continuam sem respostas as questões que se referem a como foram realizadas as projeções atuariais da proposta de reforma previdenciária e quais os seus impactos em termos de número de pessoas afetadas”, informa a nota.

De acordo com os especialistas, as estimativas do governo “superestimam a população de idosos e subestimam a população de jovens”, uma vez que a base de dados populacionais utilizada é a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), e não projeções e estimativas da população feitas pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Em 2014, ano usado como base de cálculo para a maioria das previsões da Previdência, as duas pesquisas divergiam sobre a população acima de 50 anos prevista para 2060, com uma diferença de sete milhões de pessoas.

Além disso, o economista Claudio Puty, professor da Universidade Federal do Pará e um dos autores da nota, critica o fato do governo ter apresentado apenas um cenário para sua projeção de futuro. De acordo com Puty, quando se faz previsões de longo prazo, o padrão é que analistas estabeleçam ao menos três “possíveis cenários”, considerando variáveis socioeconômicas.

“Se eles dissessem que estão sendo conservadores para ter um cuidado maior, mas não é o caso. O problema é que você não publica intervalos de confiança, a famosa margem de erro. Você pode imaginar, com uma previsão visando 2060, que a variação de confiança é muito ampla. Mas eles tratam com uma certeza pseudo-científica”, critica o economista.

Segundo a análise, as estimativas do Ministério da Fazenda também subestimam o potencial de arrecadação da Previdência. Ao utilizar como base de dados a PNAD de 2014, quando o número de desempregados cresceu 9,3%, o cálculo afeta negativamente o número estimado de contribuintes, reduzindo a previsão da receita previdenciária. Além disso, o governo ignora impactos das suas próprias ações, como a reforma trabalhista e a terceirização.

Outro cálculo que apresenta erros é o do salário mínimo. O crescimento anual previsto está na média de 6%, enquanto inflação e PIB caem. Como os dois índices compõem a base de cálculo para o reajuste do salário mínimo, a não ser que seja alterada a fórmula, a conta não fecha.

Sem fontes
Governo também não apresentou fontes dos números utilizados, nem explicou quais cálculos e fórmulas foram aplicados para se chegar às suas previsões apocalípticas.

De acordo com Solon de Carvalho, pesquisador titular do Laboratório Associado de Computação e Matemática Aplicada no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o formato e a qualidade dos arquivos dificultaram a avaliação dos dados. “Trabalhamos para analisar na melhor maneira. O arquivo de Excel continha 423 planilhas onde colaram apenas os valores, excluindo as fórmulas que levaram a esses números. Por isso, se tornou um quebra-cabeça matemático.”

“Como é que pode alguém se basear em previsões que têm erros como o congelamento de todas as variáveis econômicas? E por que eles estão usando especificamente os dados de 2014? Henrique Meirelles [ministro da Fazenda] disse recentemente que, se nada for feito, em 2060 as despesas da Previdência subirão para 17,2% do PIB. É o quarto ou quinto número a que eles chegam em poucos meses. Como eles chegam a esses números? E, ainda por cima, na precisão de décimos… O problema não é a previsão, é o determinismo. Então todo mundo sabe de tudo que vai acontecer até 2060? Mas, isso, ninguém explica”, critica Carvalho.

Faltam dados
Os especialistas também criticaram a ausência de uma simulação dos impactos da reforma, para além da questão fiscal, caso aprovada. De acordo com a conclusão apresentada, faltam dados para fazer esse cálculo.

Segundo Carvalho, a única análise de renda feita é a diferenciação entre quem ganha um salário mínimo e quem ganha mais do que um salário mínimo. O matemático lembra que o Brasil é muito mais plural e explica que uma análise detalhada das demais faixas de renda apontaria para uma perda significativa do poder de compra na aposentadoria de quem ganha entre dois a dez salários.

Por fim, os especialistas responsáveis pela análise das projeções do governo criticam a ausência de uma estimativa do impacto da exigência de idade mínima sobre a contribuição. Muitas pessoas poderiam se sentir desestimuladas a contribuir – uma vez que só poderão se aposentar aos 65 anos – e passariam a investir em previdência privada. Em novembro, segundo levantamento da FenaPrevi (Federação Nacional de Previdência Privada e Vida), os contratos fechados de planos de previdência privada tiveram crescimento de 26%.

É hora de reagir!

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Fonte: SEEB SP

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