A partir de 10 de maio, os quase 28 milhões de habitantes dos 376 municípios onde a empresa atua terão que arcar com aumento acima da inflação. No médio prazo, tarifas devem aumentar ainda mais, se a Sabesp for privatizada
A Sabesp anunciou nesta terça-feira (9) que vai reajustar em 6,44% as tarifas dos serviços básicos de água e saneamento. A Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp) foi o órgão que autorizou o aumento. De acordo com a Sabesp, os novos valores passarão a vigorar a partir de 10 de maio.
O reajuste veio acima da inflação acumulada nos últimos 12 meses, que foi de 4,50%, conforme o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Assim, os quase 28 milhões de habitantes dos 376 municípios onde a empresa atua terão que arcar com o prejuízo.
Por outro lado, o mercado comemorou a notícia. Nesta terça-feira, as ações da Sabesp subiram cerca de 1% durante a abertura do pregão da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), alcançando a cotação recorde de R$ 85,35. Ao longo do dia, as ações oscilaram, como resultado da realização dos lucros dos acionistas. Durante o fechamento desta reportagem, os papeis registravam alta de 0,49%.
Os grandes bancos também comemoraram a notícia. O Bradesco, por exemplo, deixando a desfaçatez de lado, disse que é “sempre positivo de ver” quando uma empresa tem reajuste tarifário acima da inflação. Na mesma linha, o Citi disse que o índice oferecido pela Arsesp “surpreendeu”. Com o reajuste, o banco estadunidense prevê que os lucros da Sabesp devem subir cerca 10% até o ano que vem. Desde o início do ano, os papéis da Sabesp registraram alta de 12,47%.
Privatização avança
A euforia dos investidores se dá em meio ao avanço do processo de privatização da Sabesp, carro-chefe do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Ontem a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), da Câmara Municipal de São Paulo, aprovou a adesão da capital à venda da empresa. Foram 7 votos a favor e três contra. Os vereadores Alessandro Guedes (PT), Professor Toninho Vespoli (PSOL) e Eliseu Gabriel (PSB) se opuseram à proposta.
A direção do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de São Paulo (Sintaema) classificou a decisão como um “absurdo”. Além disso, revela o “descompromisso” de parte dos vereadores de São Paulo com a população, “sobretudo a que mais precisa”.
Apesar da aprovação, o sindicato destaca ainda que serão realizadas diversas audiências e a luta continua dentro e fora da Câmara para barrar essa proposta “nefasta”. Para o presidente José Faggian, a privatização da Sabesp não encontra nenhum amparo técnico. Trata-se de uma decisão política de Tarcísio, para privilegiar os investidores. Isso porque a companhia é uma empresa lucrativa, o que derruba o principal argumento em favor da privatização.
“É para privilegiar um grupo pequeno dos donos do capital, que vão comprar e que vão ter lucro. É pior do que comprar, porque não vão ter que adquirir a empresa inteira. Na verdade, vão vender uma parcela de ações, e junto vai a direção da empresa. É privilegiar esse pessoal que vai pegar uma empresa eficiente, ajeitada, e vão ganhar dinheiro em cima disso”.
No final do ano passado, a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou o Projeto de Lei (PL) 1.501, que permite a desestatização da companhia. Nesse sentido, se a adesão da capital paulista passar no plenário da Câmara, fica praticamente pavimentado o caminho para a privatização.
Regulação externa e risco de aumento
Nesse sentido, Faggian alerta para o risco de mais aumento da tarifa após a privatização. Isso porque o modelo que o governo defende inclui retirar a Sabesp privatizada do “guarda-chuvas” da atual agência reguladora. Em seu lugar, seria criada uma “agência reguladora externa”, com uma parte dos conselheiros indicados pela própria companhia, em flagrante conflito de interesses.
Além disso, ele destaca que o processo de privatização prevê a criação de um fundo para amortizar os impactos nas tarifas. De início, Tarcísio dizia que a venda da Sabesp faria reduzir a conta de água. Após o projeto ser aprovado na Alesp, mudou o discurso, dizendo que as tarifas “vão subir menos com a privatização”. Contudo, Faggian pontua que, se a tarifa for reduzida em 10%, esse fundo acaba em 18 meses.
Outro “absurdo”, segundo ele, é que assim o Estado vai utilizar dinheiro público para financiar eventual redução, garantindo, mais uma vez, os interesses dos investidores. Nesse sentido, ele prevê que a tarifa deve subir no médio prazo – em dois ou três anos. Ou então vai faltar recursos para garantir a universalização dos serviços de saneamento, outro eixo que Tarcísio utiliza para defender a privatização.
Como exemplo, ele cita o processo de privatização dos serviços de saneamento no Estado do Rio de Janeiro. Além de aumentar as tarifas, a companhia Águas do Rio vem sofrendo críticas constantes em relação à qualidade da água. E também pouco avança na ampliação dos serviços de coleta e tratamento de esgoto. “Em dois ou três anos, a gente vai sentir os impactos. Não tem mais fundo, e vai acontecer o que aconteceu no Rio de Janeiro. Os investimentos deixam de ser feitos, ou faz investimentos e aumenta a tarifa, na proporção que a empresa achar que é necessária. O estado fica refém.”