Os dados apresentados pelas economistas do Dieese mostram como os avanços tecnológicos têm gerado impactos para os trabalhadores do Ramo Financeiro
As mudanças no perfil da categoria bancária foi tema de debate na Conferência Estadual dos Bancários e das Bancárias, do Espírito Santo (ES), dia 1/7. As economistas do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Bárbara Vazquez e Vivian Machado apresentaram dados que explicam as mudanças no perfil da categoria bancária. A partir dos dados apresentados, os bancários sinalizaram que é necessário urgentemente aprofundar a discussão.
A economista Bárbara Vazquez, que é coordenadora da Escola Dieese de Ciências do Trabalho, fez alguns questionamentos iniciais para aquecer o debate: “Quais são os nossos desafios como movimento sindical, como sindicalismo bancário? Qual é a responsabilidade que essa categoria tem na construção das lutas sociais e na conformação das instituições públicas de proteção ao trabalho no Brasil?”.
Ela apontou alguns enclaves impostos pelo capitalismo à classe trabalhadora que precisam ser enfrentados pelo movimento sindical. “Nós temos um capitalismo que prometeu igualdade, liberdade, fraternidade e entregou um sistema que é mais congelado em termos de mobilidade social do que o Antigo Regime [sistema imposto pela aristocracia europeia entre os séculos XV e XVIII]. Um trabalhador que nasce pobre, tem pouquíssimas possibilidades de qualquer tipo de ascensão social. Nossa principal tarefa no Brasil é salvar as instituições, reconstruir o Estado brasileiro, sempre visando a distribuição de renda”, pontuou.
Desigualdades
Bárbara destacou as desigualdades no mundo. Ela chamou atenção para a grave concentração de riqueza no Brasil. Os países periféricos são os que têm a pior relação entre o rendimento dos 10% mais ricos e 50% mais pobres. “É evidente que aqui no Brasil, mesmo a luta mais simples de distribuição, tem uma reação das elites, que é muito brutal”, assinalou.
“Nós chegamos ao longo do século XIX com o livre mercado comandando as relações sociais, alterando as relações entre trabalhadores e em todas as esferas da vida. O século XX alterou essa correlação. E o século XXI, para onde vai nos levar? Essa é a pergunta. Vocês, na condição de trabalhadores, precisam formular essa pergunta”, provocou.
PIB per capita estacionado
A economista chamou atenção para PIB per capita no Brasil no período de 1996 a 2022 (gráfico abaixo). “Nós estamos estacionados no mesmo volume de produção desde 2014. Ah, mas em 2022 o Brasil cresceu. Cresceu comparando com 2020 ou 2021. O fato concreto é que em 2022 o PIB per capita por habitante estava em R$ 46 mil. Em 2014 era 48 mil reais. O Brasil tem um problema de distribuição de renda, mas também de estratégia de crescimento. Estamos passando por um período de reversão dessa tendência, mas ainda atuando nesse estágio de coisas”, advertiu.
IBGE/DIEESE
Sindicalização
Bárbara trouxe para o debate dados que confirmam uma queda acentuada na taxa de sindicalização no país e especificamente no Ramo Financeiro. Em 2017, ano da aprovação da reforma trabalhista, houve uma queda brusca da taxa de sindicalização dos trabalhadores do Ramo Financeiro. A taxa, que em 2017 era de 30,5%, caiu para 19,5% em 2019. No primeiro ano do governo Lula, em 2003, a taxa de sindicalização chegou a 47% (tabela abaixo).
Apesar da queda acentuada da taxa de sindicalização, Bárbara disse que também trazia boas notícias. Ela afirmou que sob o governo Bolsonaro, no momento mais crítico para classe trabalhadora, a taxa de sindicalização dos bancários não caiu. “Ao contrário, os bancários seguiram se sindicalizando, o movimento sindical se manteve presente, dialogando com uma base que, em parte, não votou nos candidatos mais progressistas nas eleições de 2018”. Bárbara destacou ainda que o movimento sindical fez essa luta em plena pandemia.
Gema encolheu
A economista perguntou: “Mas qual é então o nosso problema?”. Bárbara explicou que a categoria bancária está reduzindo cada vez mais. Ela faz uma analogia com um ovo cuja gema, que representa o centro do Ramo Financeiro, é cada vez menor, e a clara, a periferia do Ramo, aumenta. A economista disse que o movimento precisa dar um salto para fora com o objetivo de alcançar os trabalhadores de cooperativas, terceirizados e outros de setores que estão na periferia do Ramo financeiro.
A ameaça tecnológica
Os primeiros dados apresentados por Vivian Machado revelaram que os bancos estão apostando todas as fichas nas inovações tecnológicas. Entre a iniciativa privada, a economista apontou que nenhum outro setor investiu tanto em tecnologia. “Em 2022, o investimento chegou a R$ 34,9 bilhões, crescimento de 18% em relação a 2021”, destacou. Em 2018, os investimentos em tecnologias foram de R$ 19,8 bilhões.
Ela explicou que esse investimento se reflete nas operações dos bancos, cada vez mais digitalizadas. Em 2018, 41% das operações eram realizadas por internet banking ou contra 6% executadas em agências bancárias. Em 2022, as transações via internet subiram para 66%, enquanto as operações presenciais em agências caíram para 2%.
Vivian também alertou que a categoria bancária vem encolhendo nos últimos anos com o fechamento de agências e postos de trabalho. Em 1990, de acordo com dados do Ministério do Emprego e Trabalho (MTE), os bancários eram quase 800 mil. Em 2021, esse número caiu praticamente pela metade, se reduzindo a 442 mil trabalhadores. Ela apontou também que as agências físicas passaram de 23 mil em 2015 para pouco mais de 17 mil em 2022, queda de 22,5%.
Mudança de perfil da categoria
Em 1990, a categoria bancária respondia por 95% dos trabalhadores do Ramo Financeiro. Em 2021, esse percentual despencou para 43%.