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União estável homoafetiva, um direito conquistado

18 de maio de 2011

O Supremo Tribunal Federal, no dia 5 de maio de 2011, decidiu por unanimidade reconhecer, juridicamente, a união estável homoafetiva. Assim, o STF reconheceu como legítimas e constitucionais decisões que já acontecem em dez estados brasileiros em 1ª e 2ª instâncias e em mais de vinte países. Decisão justa, que trouxe alegria aos defensores do respeito à orientação sexual homossexual. Declara-se assim o início do fim da hegemonia da moral heterossexual. Abre caminho para a afirmação à luz do dia das uniões estáveis entre homossexuais que até aqui pagavam um altíssimo preço pelas suas opções. Mas segmentos conservadores ficaram irritados e questionam o acerto da decisão do STF.
 
Para a decisão, o STF se fundamentou em vários argumentos jurídicos, tais como “a homossexualidade caracteriza a humanidade de uma pessoa. Não é crime. Então por que o homossexual não pode constituir uma família? Por força de duas questões que são abominadas por nossa Constituição: a intolerância e o preconceito” – frase do ministro Luiz Fux.
 
“O reconhecimento de uniões homoafetivas encontra seu fundamento em todos os dispositivos constitucionais que tratam da dignidade humana” (ministro Joaquim Barbosa).
 
“Se o reconhecimento da entidade familiar depende apenas da opção livre e responsável de constituição de vida comum para promover a dignidade dos partícipes, regida pelo afeto existente entre eles, então não parece haver dúvida de que a Constituição Federal de 1988 permite a união homoafetiva admitida como tal” (ministro Marco Aurélio).
 
“Aqueles que fazem sua opção pela união homoafetiva não podem ser desigualados em sua cidadania. Ninguém pode ser de uma classe de cidadãos diferentes e inferiores, porque fez a escolha afetiva e sexual diferente da maioria” (ministra Cármen Lúcia).
 
“O Supremo restitui (aos homossexuais) o respeito que merecem, reconhece seus direitos, restaura a sua dignidade, afirma a sua identidade e restaura a sua liberdade” (ministra Ellen Gracie).
 
“É arbitrário e inaceitável qualquer estatuto que puna, exclua, discrimine ou fomente a intolerância, estimule o desrespeito e a desigualdade e as pessoas em razão de sua orientação sexual” (ministro Celso de Mello).
 
Se o elo mais forte de uma corrente é o elo mais fraco, só poderá ser mais justo o que for tratado a partir do elo enfraquecido e discriminado. Numa sociedade preconceituosa, intolerante, hipócrita e cínica, os homossexuais são um dos elos discriminados. Feliz do povo que ouve os clamores dos que fazem outra opção sexual senão a hegemônica. Quanta dor! Quanta lágrima derramada! Quanta cruz carregada!
 
Devemos respeitar todos, mas não podemos respeitar todos da mesma forma. Devemos respeitar as minorias – sem terra, mulheres, negros, deficientes, idosos, indígenas, homossexuais, sem casa etc. – nos colocando na e da perspectiva deles para a partir deles nos posicionar sobre o que deve ser considerado justo. E devemos respeitar os diferentes que estão na classe dominante – latifundiário, machistas, racistas, “normais”, fortes, brancos, heterossexuais, especuladores etc. – fazendo de tudo para retirar das mãos deles as armas de opressão com as quais discriminam, muitas vezes, inconsciente e involuntariamente.
 
Na Bíblia, o primeiro relato da Criação (Gen. 1,1-2,4a) mostra o ser humano profundamente ligado e interconectado a todas as criaturas do universo. De uma forma poética, o relato bíblico insiste na fraternidade de fundo que existe entre todos os seres vivos que são uma beleza. Nas ondas da evolução, Deus, ao criar, sempre se extasia diante de todas as criaturas e exclama: “Que beleza! Bom! Muito bom!” O livro de Atos dos Apóstolos resgata, nas primeiras comunidades cristãs, essa mística ao dizer que não há nada impuro. Tudo é puro, é sagrado. Deus não faz acepção de pessoas, não discrimina. O apóstolo Pedro ressalta a ordem divina de não chamar de profano ou de impuro nenhuma pessoa (At 10,28). Pedro muda de atitude e passa a perceber que Deus não faz discriminação de pessoas. O importante é a prática da Justiça (At 10,34-35). O autor da Carta de Tiago nos alerta que Deus não faz distinção de pessoas, mas faz opção pelos pobres. Não é tolerável rico discriminar pobre. (cf. Tg 2,1-9). Numa sociedade hegemonicamente heterossexual, os homossexuais são “pobres”. Por isso, devem ser respeitados e compreendidos.
 
Na decisão do STF – que reconheceu a união estável entre as pessoas de opção homoafetiva – não se pode deixar de destacar e parabenizar a luta do movimento pelos direitos dos homossexuais, que incansavelmente, no Brasil e no mundo, vem marchando pelas ruas, erguendo suas bandeiras, gritando de diferentes formas o direito que agora é reconhecido. Os ministros do STF não criaram uma novidade, mas em cada voto ecoaram os clamores das pessoas homossexuais que lutam pela afirmação de seus direitos há tanto tempo.
 
Nesse caso, o STF deu exemplo de coragem e cidadania. Tornou-se visível o invisível. Mas a luta continua. Luta contra a homofobia, o preconceito e o conservadorismo que só excluem e negam a liberdade e a dignidade constitucionalmente garantidas e biblicamente amparadas.
 
Enfim, é ético seguir o seguinte princípio: No necessário, a unidade; no discutível, a liberdade; em tudo, o amor.

Fonte: FREI GILVANDER MOREIRA

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