“Temos que ter um Estado forte para termos um mercado forte”, diz João Sicsú. Para Maria Lúcia Fattorelli, “problema do gasto público não está no servidor, mas nos mecanismos que geram dívida pública”
“O que todas as experiências têm mostrado é que onde os Estados são fracos, os mercados também são fracos. O que a gente tem que ter é um Estado forte, atuante, para termos um mercado forte.” A avaliação é o do economista e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) João Sicsú, sobre a proposta de reforma administrativa do governo, a PEC 32/2020 (leia a íntegra aqui).
A proposta, baseada na ideia do Estado mínimo e seguir na esteira da demonização do servidor público, agrada ao mercado que, para o analista, o impacto que ambos os conceitos causarão ao próprio mercado. “Existe uma campanha feita há muitos anos, no mundo inteiro, desde os anos 80, para desvalorizar a atividade do Estado e a atividade pública, em oposição a valorizar o mercado e atividade provada. Mas nenhuma experiência histórica mostra que uma sociedade pode se desenvolver com Estado fraco.”
Um dos idealizadores do texto enviado à Câmara dos Deputados, Paulo Uebel, ex-secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, defendeu nesta quarta-feira (16), em entrevista ao Congresso em Foco, que a proposta “poderia ter um alcance maior” e produzir o “dobro de economia” aos cofres públicos. O ex-assessor direto de Paulo Guedes quer incluir os servidores em atividade na reforma, que prevê as alterações a partir dos futuros contratados.
Complementares
Para Sicsú, a complementaridade entre a presença do poder público e o fortalecimento mais abrangente e duradouro da economia não está no horizonte “desses que querem só mercado para poucos e uma concentração de renda e riquezas muito grandes”. Em resumo, uma sociedade “para todos” depende de um Estado forte e atuante. O economista observa como exemplo a educação de nível superior. “As universidades privadas tentam melhorar quando as públicas mostram sua qualidade. Se as universidades públicas forem ruins, as privadas também serão.”
Maria Lucia Fattorelli, coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, discorda do argumento usado pelo governo Bolsonaro – sanear a saúde fiscal do Estado – para elaborar a proposta, jogando a responsabilidade sobre o funcionalismo. “A desculpa de sempre é que tem que cortar gastos. Mas o problema do gasto público não está no servidor. Está sim no problema financeiro, no financiamento da política monetária do Banco Central. São os mecanismos de política monetária do BC que geram dívida pública”.
A proposta de reforma administrativa do governo, destaca Sicsú, se apoia em uma visão de economia “para poucos, muitos desempregados, milhões de miseráveis e alguns poucos com muita renda e riqueza, assim como algumas empresas também, em geral de produção ou extração de produtos básicos”. Essa economia, acrescenta, deixa 150 ou 160 milhões de brasileiros excluídos de uma vida digna.
Necessidades dos brasileiros
Em vez de “enxugar a máquina”, dizem as entidades representantes do funcionalismo, a necessidade é de contratação por concursos públicos. “Desde a década de 90, a população brasileira cresceu, enquanto a quantidade de servidores ativos permanece mais ou menos a mesma”, dizem.
“PEC da rachadinha“
Com a eliminação de concursos, e a consequente abertura de contratação terceirizada, ficará institucionalizada a chamada rachadinha, argumentam, já que “funcionários poderão ser contratados sem critérios claros, o que estimularia a corrupção.”
O próximo 30 de setembro será o Dia Nacional de Luta para o funcionalismo público. Entre as ações programadas, está “o amplo debate sobre a construção e deflagração de uma greve geral do setor”. No dia 28 de outubro será o Dia Nacional do “Eu Luto Pelos Serviços Públicos”.
Fonte: Rede Brasil Atual
Escrito por: Por Eduardo Maretti, da RBA