Laura Cymbalista
Mulheres Protestando – Di Cavalcanti, 1941
Às vésperas do 08 de março, dia internacional de luta das mulheres, lembramos o histórico de luta e resistência das mulheres por todo o mundo, especialmente as operárias russas que foram às ruas contra a fome, a guerra e a tirania, sendo estopim da Revolução Russa. Anos mais tarde, Clara Zetkin torna este dia a referência de luta das mulheres socialistas, no Congresso Internacional das Mulheres Socialistas em 1921, em Copenhague.
Seguimos nas ruas e as ocuparemos novamente neste 08 de março para reafirmar que a luta feminista e socialista segue atual e necessária. Um dos embates é contra a idéia de que o feminismo e suas reivindicações estariam superados, que as mulheres já estão no mercado de trabalho e, até mesmo, na Presidência da República. Mas o machismo e a desigualdade seguem fortes, presentes ideologicamente e deixando marcas na vida e no corpo das mulheres.
Marcas oriundas da ausência de direitos e da gradativa diminuição do Estado nos serviços essenciais, como saúde, educação, moradia e previdência social; também da dupla exploração de sua força de trabalho, com o trabalho doméstico, desqualificado e não pago, e também na ocupação dos postos mais precarizados e mal remunerados. As mulheres são a maioria da população brasileira hoje e também são a maioria das pessoas que vive com menos de um salário mínimo. A diferença salarial entre homens e mulheres persiste, aliada ao componente étnico–racial que aumenta a desigualdade e exploração das mulheres negras.É urgente transformarmos a realidade de super exploração que estão submetidas as mulheres trabalhadoras!
A violência contra as mulheres ainda é gritante, responsável por uma realidade de medo e humilhação. A pesar da aprovação da Lei Maria da Penha, que representou um avanço jurídico importante, é preciso condições para implementação da lei com recursos e ações efetivas para combater a violência sexista. A violência contra a mulher ainda é vista como algo natural, comum e trivial.
A cobertura dada pela imprensa espetaculariza a violência e, ao mesmo tempo, reforça essa trivialidade. Além dos instrumentos legais, é preciso avançar na consciência da população, combatendo toda e qualquer expressão do machismo. Afinal, é o machismo a única causa desse tipo de violência. É a ideologia machista que vê a mulher com inferioridade, como coisa, subalterna, submissa, sem condições para fazer escolhas e participar da política, sem independência e autonomia para viver sua sexualidade e decidir acerca de seu corpo. A violência contra a mulher é o machismo em movimento, que fere e mata mulheres diuturnamente. Nossa luta é contra a violência, a banalização e o silêncio.
Lutamos pelo Estado laico, para que os direitos e as políticas públicas não sejam ditados por interesses de grupos religiosos. Respeitamos a opção de fé de cada cidadão, inclusive a opção de não ter fé alguma. Entretanto, os grupos religiosos, a chamada “bancada da fé”, vêm se empenhando em perseguir e criminalizar as mulheres que realizam a prática do aborto e incidir sobre a legislação com diversos projetos para restringir ainda mais a prática do aborto e ações referentes à autonomia das mulheres sobre seu corpo. Esse grupo é poderoso e o governo Dilma segue barganhando os direitos das mulheres em troca de votos e governabilidade.
A medida provisória 557 que institui o cadastro de gestantes é um exemplo dessa política, justifica-se o controle das gestantes por meio de um cadastro nacional para, supostamente, reduzir a mortalidade materna. Não há nenhuma iniciativa concreta na área da saúde e tampouco refere-se ao aborto inseguro como uma das causas da mortalidade materna. Um cadastro não resolverá um problema de saúde pública. E a lógica não pode ser do controle e criminalização, mas de educação sexual, acesso a métodos contraceptivos e aborto seguro para interrupção da gravidez indesejada. O debate e posicionamento em relação à legalização do aborto deve ocorrer pautado no debate do estado laico, da saúde pública e na defesa da vida e autonomia das mulheres. Sem hipocrisia e fundamentalismos.
Temos muito a reivindicar e estamos nas ruas para dizer que sem feminismo não há transformação dessa sociedade. Não há luta por liberdade, por justiça, por uma sociedade socialista se as mulheres seguem exploradas e oprimidas. Tomemos as ruas no 08 de março, por socialismo e liberdade!
Fonte: Laura Cymbalista – professora da rede pública municipal de São Paulo, diretora do SINPEEM pela oposição. Setorial de mulheres do PSOL .