Profissionais falam sobre a chamada somatização e explicam a ligação com o medo
O aumento e intensificação dos quadros de ansiedade e síndrome do pânico durante a quarentena provocada pela pandemia do Coronavírus já era um quadro previsto entre médicos e psicólogos no Brasil. Mas um fenômeno preocupante que também foi identificado em pessoas com esses transtornos é a dificuldade de alguns pacientes em diferenciar a falta de ar provocada pela ansiedade da provocada pelo covid-19, sintoma comum das duas doenças.
O psicólogo João Pedro Bohrer relata o fenômeno. “Uma coisa que tem acontecido muito é a confusão do sintoma de falta de ar da ansiedade com o mesmo sintoma do coronavírus. Isso é parte de um processo que nós chamamos de somatização: a pessoa começa a imaginar os sintomas e então tem a sensação de que esses sintomas começaram a ocorrer”, explica.
>>> Crise do coronavírus acentua desigualdade de gênero e raça, diz estudo
A confusão de sintomas em vítimas da síndrome do pânico é explicada pela psicóloga clínica e doutora em psicologia Patricia Demoly, que afirma que o fenômeno está intimamente ligado ao medo. “A síndrome do Pânico é caracterizada (entre outros sintomas) por um medo iminente de morte e pensamentos repetitivos catastróficos”.
Patricia afirma que, para diferenciar a alteração respiratória provocada nos dois casos, deve-se verificar se a falta de ar vem acompanhada dos demais sintomas típicos do covid-19: febre, tosse seca, perda de olfato e do paladar. Essa diferenciação pode contar com a ajuda de um profissional da psicologia. Bohler acrescenta também que a falta de ar provocada pelo coronavírus se intensifica ao realizar algum esforço ou exercício físico, o que também pode ajudar a diferenciar os dois quadros.
Intensificação dos casos
Os efeitos da pandemia e da quarentena em vítimas da ansiedade já puderam ser percebidos entre psicólogos e pacientes. “Eu percebi um processo de intensificação dos sintomas, muito por conta da forma como eles têm recebido as notícias. Esses pacientes já estavam em processo de melhora e voltaram a apresentar os sintomas de modo maduro, sintomas de ansiedade muito fortes”, afirma Bohler.
A estudante universitária Beatriz Bonfim, de 22 anos, lida há três anos com o transtorno de ansiedade e afirma que a quebra de rotina imposta pelo confinamento tornou seus sintomas mais presentes. “A partir do momento em que meu trabalho virou home office e minha faculdade começou a ensinar à distância, essa quebra de rotina me deixou desestabilizada. (…) Eu comecei a de fato sentir os sintomas nessa fase de ficar enclausurada, ficar em casa, não poder sair. De não ter a rede de apoio que costumamos ter quando vivemos a vida normalmente”.
A bacharela em Direito Maria Thamyres Almeida, 24, diagnosticada há sete anos com síndrome do pânico, também relata sentir constantemente os sintomas da ansiedades desde a chegada do Coronavírus; ainda mais ao lembrar da probabilidade de demora para o fim da epidemia. “Até lá, eu terei que conviver todos os dias com medo. Medo de me infectar, medo da minha família se contaminar, além da sensação de impotência”, afirma.
Patricia explica que o sentimento de impotência é o principal responsável pela piora dos sintomas. “Nossa sociedade nos cobra que sejamos sempre produtivos e detentores de poder, ou seja, ‘controladores’ de tudo. Dessa forma, com a pandemia, os indivíduos passaram a perceber a falta de controle que pensaram ter sobre as coisas. Isso é um grande fator de ansiedade e faz com que os sintomas se agravem”.
Acompanhe as novidades e informações para a categoria pelas nossas redes sociais: facebook, instagram, twitter, telegram e whatsapp.
>>> O coronavírus pode causar outra epidemia que devemos evitar: depressão
Fonte: Jornal de Brasília – 01/04/2020
Escrito por: Lucas Neiva