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Iara Lee: “por que vou para Gaza”

3 de junho de 2010

Carta aberta da cineasta e ativista Iara Lee, única brasileira a integrar a flotilha de ajuda humanitária à Faixa de Gaza, que sofreu um ataque do exército israelense no início desta segunda-feira e vitimou onze voluntários turcos. No texto, escrito antes da ofensiva que já causa protestos pelo mundo inteiro, Iara alertava sobre a possibilidade de seu navio ser barrado pelas forças armadas sionistas e clamava por mais indignação. “Todos devem exigir que sejam abertos canais humanitários a Gaza. Nós todos temos de aumentar nossas vozes em protesto contra esta vergonhosa violação dos direitos humanos”.

Iara Lee

Em alguns dias eu serei a única brasileira a embarcar num navio que integra a Gaza Freedom Flotilla. A recente decisão do governo israelense de impedir a entrada do acadêmico internacionalmente reconhecido Noam Chomsky nos Territórios Ocupados da Palestina sugere que também seremos barrados. Não obstante, partiremos com a intenção de entregar comida, água, suprimentos médicos e materiais de construção às comunidades de Gaza.

Normalmente eu consideraria uma missão de boa vontade como esta completamente inócua. Mas agora estamos diante de uma crise que afeta os cidadãos palestinos criada pela política internacional. É resultado da atitude de Israel de cercar Gaza em pleno desafio à lei internacional. Embora o presidente Lula tenha tomado algumas medidas para promover a paz no Oriente Médio, mais ação civil é necessária para sensibilizar as pessoas sobre o grave abuso de direitos humanos em Gaza.

O cerco à Faixa de Gaza pelo governo israelense tem origem em 2005, e vem sendo rigorosamente mantido desde a ofensiva militar de 2008-09, que deixou mais de 1.400 mortos e 14.000 lares destruídos. Israel argumenta que suas ações militares intensificadas ocorreram em resposta ao disparo de foguetes ordenado pelo governo do Hamas, cuja legitimidade não reconhece. Porém, segundo organizações internacionais de direitos humanos como a Human Rights Watch, a reação militar israelense tem sido extremamente desproporcional.

O cerco não visa militantes palestinos, mas infringe as normas internacionais ao condenar todos pelas ações de alguns. Uma reportagem publicada por Anistia Internacional, Oxfam, Save the Children e CARE relatou que “a crise humanitária (em Gaza) é resultado direto da contínua punição de homens, mulheres e crianças inocentes e é ilegal sob a lei internacional”.

Como resultado do cerco, civis em Gaza, inclusive crianças e outros inocentes que se encontram no meio do conflito, não têm água limpa para beber, já que as autoridades não podem consertar usinas de tratamento destruídas pelos israelenses. Ataques aéreos que danaram infra-estruturas civis básicas, junto com a redução da importação, deixaram a população de Gaza sem comida e remédios de que precisam para uma sobrevivência saudável.

Nós que enfrentamos esta viagem estamos, é claro, preocupados com nossa segurança também. Anteriormente, alguns barcos que tentaram trazer abastecimentos a Gaza foram violentamente assediados pelas forças israelenses. No dia 30 de dezembro de 2008, o navio ‘Dignity’ carregava cirurgiões voluntários e três toneladas de suprimentos médicos quando foi atacado sem aviso prévio por um navio israelense, que o alvejou três vezes a aproximadamente 90 milhas da costa de Gaza. Passageiros e tripulantes ficaram aterrorizados, enquanto seu navio fazia água e tropas israelenses ameaçavam com novos disparos.

Todavia eu me envolvo porque creio que ações resolutamente não violentas, que chamam a atenção ao bloqueio, são indispensáveis para esclarecer o público sobre o que está de fato ocorrendo. Simplesmente não há justificativa para impedir que cargas de ajuda humanitária alcancem um povo em crise.

Com a partida dos nossos navios, o senador Eduardo Matarazzo Suplicy mandou uma carta de apoio aos palestinos para o governo de Israel. “Eu me considero um amigo de Israel e simpatizante do povo judeu” escreveu, acrescentando, “mas por este meio, e também no Senado, expresso minha simpatia a este movimento completamente pacífico… Os oito navios doFree Gaza Movement (Movimento Gaza Livre) levarão comida, roupas, materiais de construção e a solidariedade de povos de várias nações, para que os palestinos possam reconstruir suas casas e criar um futuro novo, justo e unido”.

Seguindo este exemplo, funcionários públicos e outros civis devem exigir que sejam abertos canais humanitários a Gaza, que as pessoas recebam comida e suprimentos médicos, e que Israel faça um maior esforço para proteger inocentes. Enquanto eu estou motivada a ponto de me integrar à viagem humanitária, reconheço que muitos não têm condições de fazer o mesmo. Felizmente, é possível colaborar sem ter que embarcar em um navio. Nós todos simplesmente temos de aumentar nossas vozes em protesto contra esta vergonhosa violação dos direitos humanos.

Fonte: Iara Lee é cineasta brasileira de origem coreana e está na flotilha humanitária que levava suprimentos à Faixa de Gaza quando foi atacada pelo exército israelense em águas internacionais, o que causou a morte de onze voluntários turcos.

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