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Governo negligencia sistema elétrico e já prevê apagão

26 de agosto de 2021

Bolsonaro assinou decreto determinando o primeiro corte obrigatório no consumo de eletricidade no país. Especialistas apontavam os riscos de apagão desde o início do ano. Mas só agora o governo anuncia medidas para tentar evitar o pior

Graças à negligência do governo federal, os brasileiros correm o risco de sofrer com o segundo apagão elétrico do País em duas décadas. Especialistas apontam que o governo subestimou a dimensão da crise – e, agora, corre contra o tempo para evitar medidas drásticas. Mas, com o sistema elétrico no limite, a gestão bolsonarista já conta os dias para o apagão e terá de impor racionamentos impopulares.

 

Há dois meses, numa tentativa de aparentar controle a situação, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, fez pronunciamento em cadeia nacional para minimizar os riscos de um racionamento de energia no País. Nesta quarta-feira (25), porém, Bolsonaro assinou um decreto determinando o primeiro corte obrigatório no consumo de eletricidade no país. Órgãos públicos federais serão obrigados a reduzir uso de energia entre 10% e 20%.

 

No fim do dia, uma nota técnica do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) alertou que é necessário aumentar a oferta de energia em 5,5 GWmed para garantir o suprimento de eletricidade a partir de setembro de 2021. Como na terça-feira (24) o País consumiu cerca de 73 GWmed de energia, será necessário tomar medidas para garantir um adicional de 7%. É mais do que a hidrelétrica de Itaipu, a maior do País, tem gerado todos os dias (pouco mais de 4 GW). A usina está com o nível baixo no seu reservatório e tem gerado o menor volume de energia em décadas.

 

Especialistas apontavam os riscos de apagão desde o início do ano. Só agora, no entanto, o governo anuncia medidas para tentar evitar o pior, como a redução na vazão das hidrelétricas, a flexibilização nas margens de segurança na transmissão de energia e os incentivos à indústria para a redução do consumo de energia nos horários de pico.

 

Na quarta, o ministro de Minas e Energia afirmou que o governo ainda vai estabelecer em setembro metas de redução do consumo para clientes residenciais e pequenos empreendimentos em troca de bônus, mas sem obrigatoriedade. Ainda assim, é alto o risco de interrupções no fornecimento de energia já neste segundo semestre – e a possibilidade de blecautes é cada vez maior.

 

“O Brasil está operando no limite”, diz Roberto D’Araújo, diretor do Instituto Ilumina. “O governo está oferecendo um prêmio para a indústria reduzir o consumo no momento de pico, que é onde há problema e preocupação. Esse risco de apagão é a porta de entrada para o racionamento.”

 

Os reservatórios do Centro-Sul do País já estão em níveis mais baixos dos que aqueles que 2001, quando houve racionamento de energia. O governo se viu obrigado a adotar medidas que, na prática, deixam o País mais vulnerável a blecautes nos horários de maior demanda, segundo D’Araújo.

 

Exemplo disso são as mudanças na regras de segurança das linhas de transmissão, autorizadas sem alarde pelo Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) para incrementar em cerca de 30% a capacidade de transferência de energia do Norte e principalmente do Nordeste para Sudeste e Centro-Oeste. “As linhas de transmissão contam com uma segunda linha de redundância, caso haja problema com a primeira. Agora, as duas são usadas. Isso agrava a possibilidade de apagão.”

 

Para o especialista, o plano do governo de reduzir a vazão das hidrelétricas do Nordeste para estocar mais água e aumentar a geração e o envio para o centro-sul na fase mais crítica da seca pode ser arriscada. Ele lembra que os lagos nordestinos só representam 20% da capacidade de armazenamento no País e são importantes para a segurança energética da região.

 

Gustavo Carvalho, gerente de Preços e Estudos de Mercado da consultoria Thymus, concorda que a estratégia do governo aumenta as chances de blecaute para “cobrir demanda pontual de demanda”. Segundo ele, apesar de o País ter uma grande capacidade de geração energia, o desafio atual está na disponibilidade.

 

“Se houver uma alta forte na demanda, as hidrelétricas são as que respondem mais rápido, o que não ocorre com as outras fontes – as renováveis e térmicas”, afirma. “A situação é crítica. Estamos operando no limite e adotando medidas conjunturais que são fundamentais nesse momento, pois, caso contrário, estaríamos em um racionamento iminente.”

 

Conforme Carvalho, o nível médio dos reservatórios está hoje em cerca de 35%, bem abaixo da média de 80% dos últimos anos nessa época do ano. A previsão é que, em dezembro, o nível chegue a 16%, numa situação mais grave que de 2001. “Vamos depender do volume de chuvas no período úmido (verão) para saber se vamos ter racionamento ou não. Temos ainda o fenômeno La Niña, que pode atrasar o início do período de chuvas”, afirma ele, lembrando que a reabertura da economia tende a aumentar ainda mais o consumo de energia.

Crédito: Marcello Casal Junior/Agência Brasil
Fonte: Vermelho com O Globo

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