Cerca de 300 anos antes de Cristo, uma força militar formada por 150 casais de homossexuais, conhecida como Batalhão Sagrado, fazia o chão tremer. Armados de espadas, escudos e muita bravura, eram membros da tropa de elite da cidade grega de Tebas. Temidos e respeitados tanto pelo seu povo quanto por seus inimigos, eram quase imbatíveis, pois cada soldado lutava ao lado de seu amante, sendo responsável por sua proteção. Mais de dois mil anos depois, a aparição coletiva de “indivíduos com orientação sexual voltada para pessoas do mesmo sexo, entre outras combinações”, continua causando arrepios. Mas não pelos mesmos motivos.
Empunhando bandeiras com as cores do arco-íris, “montados” em saltos altíssimos, fantasias extravagantes, perucas exuberantes ou simplesmente vestidos de forma convencional, um festivo batalhão composto por milhares de homossexuais (hoje identificados pela sigla GLBT – gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros) invade as ruas de várias cidades do mundo uma vez por ano. Agora, como participantes das Paradas do Orgulho Gay, lutam contra a clandestinidade a que vêm sendo submetidos há séculos, desde que forças sociais, econômicas, culturais e religiosas estabeleceram os padrões “normais” de sexualidade vigentes até hoje.
Mas afinal, quando esse monte de gente foi obrigado a se esconder dentro do armário? Os mais antigos registros históricos encontrados por pesquisadores parecem mostrar que, do surgimento do homem no planeta até a Antiguidade, a sexualidade era vivida em suas variadas possibilidades com certa naturalidade. Foi somente com o advento do cristianismo e o surgimento das primeiras nações européias na Idade Média, que o sexo ganhou status de pecado, sendo justificável apenas para fins reprodutivos. Assim, todas as práticas sexuais que não se enquadravam nesta categoria viraram coisa do demônio. Passaram então a merecer punições, das mais leves, como a penitência, às mais “definitivas”, como a queima em fogueira. Com a contribuição da ciência e do direito no século 19, algumas dessas práticas, como o recém-nomeado homossexualismo, conhecido até então simplesmente como “relação entre pessoas do mesmo sexo”, passou a ser considerado também doença e crime.
Foi somente por volta dos anos 60 do século 20, com o movimento de contracultura, a revolução sexual, os avanços científicos e os progressos legais, que o homossexualismo deixou de ser considerado doença e foi descriminalizado em vários países. Conquistas que abriram espaço para um ativismo voltado para questões como o direito à visibilidade social e cidadania. Movimento que com o apoio de políticos, dos meios de comunicação, de intelectuais e de eventos, como as paradas gays, ganhou força na década de 70. Mas que com o surgimento da Aids nos anos 80 e sua vinculação inicial aos gays, sofreu um duro golpe. Revés que fez com que muita gente fosse obrigada a se tornar invisível novamente.
Gays, que nos anos 90, puderam sair das sombras graças à diminuição do pânico em relação a Aids. E que, com poder de compra, começaram a se tornar um atraente segmento de mercado a ser explorado. O que, tanto o poder público, quanto algumas empresas mais antenadas descobriram rapidamente, fazendo surgir em um passe de mágica alguns espaços amigáveis ao público gay, além de produtos, serviços, pacotes turísticos e, lógico, muita simpatia.
Atualmente a ciência se ocupa em discutir se a sexualidade humana é determinada biológica ou culturalmente. Já o direito decide se deve estender as conquistas legais da heterossexualidade aos gays ou não. Enquanto isso, é no espaço público que as batalhas mais difíceis ainda são travadas. É no dia-a-dia, nas ruas, nas escolas, nos locais destinados ao lazer, nos hospitais que todos os que tentam se tornar visíveis, sem querer no entanto se transformar em alvo, enfrentam as maiores dificuldades.
Talvez seja por isso que, ano após ano desde seu surgimento em 1970, as paradas gays no planeta todo venham ganhando proporções cada vez maiores. Pois, por enquanto, são nessas raras oportunidades que os níveis de tolerância aumentam sensivelmente mundo afora. Momentos em que outras formas de se relacionar podem ser vistas como uma realidade passível de coexistir com a dita normalidade. Sem que isso implique necessariamente na implosão da ordem social estabelecida, no final do mundo ou coisa parecida.
>> Parada Gay de São Paulo 2009
A 13ª Parada do Orgulho GLTB, que tem como tema “Sem Homofobia, Mais Cidadania – Pela Isonomia dos Direitos!”, acontece no dia 14 de junho. O evento acontecerá durante o feriado prolongado de Corpus Christi, o que deve atrair 400 mil turistas. A Parada terá a participação de 20 trios elétricos, além da realização de inúmeros eventos paralelos durante os dias que a antecedem, como a Feira Cultural, o Prêmio de Cidadania, Gay Day em um famoso parque de diversões da capital paulista, a Caminhada Lésbica e várias oficinas. A programação espera atrair 3,5 milhões de participantes, que com muita atitude e dinheiro no bolso, ajudam a garantir elevados níveis de tolerância, visibilidade e diversão pelas ruas por onde passam.
Fonte: u