É uma tarefa difícil de fazer quando já temos boas resenhas publicadas sobre o mais novo trabalho dos paraibanos da Cabruêra. Li algumas interessantes para “Visagem”, quarto disco do veterano quarteto.
Pra mim sobra especular que “Visagem” é um trabalho conceitual, seja no trato visual, no poético e no rítmico, expostos nas doze composições diversificada entre temas instrumentais, abordagens folk-regionalista e mantras típicos nordestinos. É música, mas é também poesia e imagem. Tem um trabalho gráfico maravilhoso, cuja arte tem a assinatura do fotógrafo Augusto Pessoa.
Conheço a Cabruêra desde seu começo. Hoje talvez seja o grupo que melhor une, se não for o único, a tradição musical nordestina em conjunção com a modernidade cosmopolita. Se não é o disco mais vibrante, ele tem nas suas entrelinhas sonoras a execução de algo mais complexo e cativante. A produção de luxo do músico e produtor João Parahyba (Trio Mocotó) atualizou, com leveza e sofisticação, a sonoridade sem interferir, contundente, no regionalismo particular que é a marca registrada da banda.
Esse novo trabalho comprova que sua atual formação é a mais coesa e enxuta. Arthur Pessoa, único original, conseguiu reunir excelentes músicos – Edy, Pablo e Leo – que, além disso, são bons compositores, resultado obtido na parceria do quarteto na composição e produção de todo o disco. E um detalhe importante: esses três novos membros são de formação roqueira, dando uma maior e mais interessante amplitude musical.
Outra observação definitiva é sobre a preocupação artística que cerca a banda. Em pouco mais de dez anos de existência esse é apenas o quarto álbum realizado! Ao longo do tempo estão mais interessados em manter o bom padrão de qualidade artística do que uma visão meramente mercantilista, expediente bem comum ao meio.
Mas vamos comentar as músicas do disco: “Visagem”, a faixa título de abertura retrata bem todos os argumentos ditos – um tipo de ska-frevo-maracatu supersônico infernizado e conduzido por uma seção de sopros. “Doce de coco” é um belo exemplo de mantra-folk regional com uma pitada de suave psicodelia, justificando o discurso da comunhão exemplar entre o tradicional com o moderno, notadamente influenciado pela música de Chico Science & Nação Zumbi.
Não sou chegado a uma ciranda, mas a cinematográfica “Pisa Morena” é pura malemolência envolvente que o inconsciente nos remete ao imaginário de uma cidade do interior. “Sina de Violeiro” é uma moda de viola com cara de trilha sonora de “western spaghetti” ou algo parecido; tem também a mais bela poesia “Deus nunca faz dinamite / Míssil fussil nem canhão / Apenas deu livre arbítrio / Pro homem viver no chão”(…). “Xango” é outro mantra homenagem, só que afro-caribenho. “Passarada” , na rima, parece um rap repente com sotaque carregado e empolgante. “A Pisada” é outro instrumental ska cosmopolita feito em Campina Grande, comandado pelos sopros do Maestro Spok. “Feira da Prata” deve ser mais um delírio fílmico de Arthur em seu cotidiano campinense; é um forró-samba-xaxado instrumental carimbado!
Já chegamos na metade do play e a parcimônia do “violão esferográfico” se faz presente com destaque nas faixas “Portão Azul” e “Aruanda”, esta é a verdadeira trilha sonora. O fechamento com a embolada instrumental “Pé de cabra” e a ciranda espacial “sivucana” ecologicamente correta “Fumaça”. São doze músicas e pouco mais de meia hora de duração. O “timing” certo pra o deleite de um candidato a obra-prima.
cabruera-fotoConcluindo, a Cabruêra, sem exageros, tem a faceta de “cult band”, isso porque o elemento essencial desse status é o respeito e a valorização na qualidade da música que produzem, sua atemporalidade e o rebuscamento artístico como único objetivo.
É comum para os “gringos” etiquetar esse trabalho como “world music”, justificando em parte, mas limitando no todo. É um trabalho que congrega tanto a arte européia, quanto a africana. Ou seja, é abrangente, rica e multicolorida!
Sim, o disco pode ser baixado na íntegra gratuitamente pelo site
* MySpace
myspace.com/cabrueramusic
* Contato
arthur_pessoa@yahoo.com.br
Fonte: n