Para Guilherme Mello, da Unicamp, fala do presidente interino dirigida a empresários do agronegócio é simples de entender: “Ele está falando em medidas que afetam 95% da população pobre do Brasil”
A promessa do presidente interino Michel Temer de que vai adotar medidas impopulares é um recado claro e fácil de entender. “É simples. Quando ele menciona ‘medidas impopulares’, está falando em medidas que afetam 95% da população mais pobre do Brasil, as pessoas que dependem dos serviços públicos, para beneficiar os grupos que têm mais em detrimento do povo”, diz Guilherme Mello, professor de economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“O que a gente chama de povo são as pessoas mais pobres, mais simples, que mais dependem da atuação do Estado, dos serviços públicos, da previdência pública etc. Quando um governante fala em medidas impopulares, está falando de deterioração e degradação dos serviços públicos, da escola pública, da universidade, da saúde pública, do apoio aos pequenos produtores rurais, que são o povo.”
Em evento que reuniu representantes do agronegócio em São Paulo hoje (4), Temer recebeu apoio dos empresários e declarou: "Esse apoio é fundamental porque, a partir de certo momento, começaremos com medidas, digamos assim, mais impopulares". Ele não entrou em detalhes, não esclareceu que medidas seriam essas e nem em que momento as adotaria.
Essa sinalização do presidente provisório não é isolada e vem se repetindo. Na semana passada, por exemplo, em outro encontro com empresários, desta vez do comércio, no Palácio do Planalto, ele prometeu que "pouco a pouco" vai "trazer o Brasil para realidade". “Achei que teríamos aqui 30 ou 40 pessoas e vejo que as lideranças empresariais conseguiram mobilizar todo o Brasil”, acrescentou.
Populismo
“É preciso qualificar o que é popular, o que é impopular, o que é populismo e o que não é. Até porque durante muito tempo a palavra ‘populismo’, até pela tradição da sociologia uspiana, ficou como um palavrão. O que agrada o povo são coisas negativas, loucuras, e o que não agrada são as que colocam o país nos trilhos. Criou-se essa imagem de que o que é popular é populista e o que é impopular é racional. Isso é de uma falsidade absoluta”, diz Mello.
A promessa de medidas “impopulares” e o fato de ela ter sido dirigida a empresários do agronegócio é significativa, avalia o professor da Unicamp. “Os empresários do agronegócio, claro, precisam muito menos do Estado do que os pequenos produtores rurais, que necessitam de seguro, de apoio técnico e de financiamento. Como medidas impopulares são aquelas contra a população, ele está falando em cortar, por exemplo, financiamento ao pequeno produtor, cortar verba da saúde pública, da previdência pública”, diz Mello.
Para ele, o pequeno produtor rural que tinha previdência rural pode vir a perder o benefício ou sofrer com sua redução. “A justificativa é de que isso é racional. Não é racional, nessa ótica, taxar as grandes fortunas. Taxar os bilionários é uma medida popular e por isso é considerada ensandecida, porque os mais ricos ‘são o motor da sociedade brasileira’. O que não é ensandecido é tirar a saúde, a previdência, a educação, isso é razoável, racional, para o bem do país, segundo a opinião dessa entidade chamada mercado”, ironiza.
Em sua conta no Twitter, o deputado federal Ivan Valente (Psol-SP) comentou a promessa do presidente interino. “Temer anuncia que tomará ‘medidas impopulares’. Lacônico, o golpismo prenuncia a catástrofe”, escreveu. “Temer anuncia mais ataques, as tais ‘medidas impopulares’, mas isso depois do impeachment, vai que o golpe derrape”, acrescentou o parlamentar.
Guilherme lembra que Temer já adotou medidas “impopulares” não para retirar direitos, mas para angariar apoios. Há um mês, em consonância com o presidente, a Câmara aprovou um pacote de reajuste para o Executivo, o Judiciário, o Legislativo e o Ministério Público que terá impacto de ao menos R$ 58 bilhões até 2019, segundo estimativas.
Fonte: Rede Brasil Atual