Aprovado em regime de urgência, o Projeto de Lei autoriza, entre outras medidas, que o uso de agrotóxicos seja analisado apenas pelo Ministério da Agricultura, que é chefiado por ruralistas interessados no pacote de venenos
A Câmara dos Deputados aprovou ontem quarta-feira (9/2), em caráter de urgência, o projeto de lei 6299/2002, que altera o regime de avaliação e aprovação de agrotóxicos no Brasil. O presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) e a base aliada ao governo Bolsonaro pediram urgência urgentíssima para a tramitação do PL e seus adendos, e, vendo que tinham ampla maioria, apressaram-se em aprovar tudo ontem mesmo, sem que tivesse que passar pelas comissões, disse o deputado Paulo Ramos (PDT-RJ).
Chamado de “PL do Veneno” por ambientalistas, a medida assinada por vários deputados, entre eles o ruralista Luiz Nishimori (PL/PR), autoriza, entre outras medidas, que o uso de pesticidas seja analisado apenas pelo Ministério da Agricultura.
Entre as propostas defendidas pelos ruralistas está a anulação da medida que determina que os agrotóxicos sejam analisados pelos ministérios da Saúde, Meio Ambiente e da Agricultura antes de serem aprovados para uso. Outra alteração requerida é a facilitação da fiscalização dos pesticidas e da importação e exportação de insumos.
De acordo com a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a proposta prevê uma análise mais completa e leva em consideração todos os riscos envolvidos à saúde e ao meio ambiente, inclusive, acrescenta critérios referentes à exposição das pessoas a esses produtos, a exemplo do que é feito em países com agricultura similar à brasileira, como Austrália e Estados Unidos. O PL também propõe que o termo “agrotóxico” seja substituído por “pesticida”.
O texto tem origem em um projeto do então senador Blairo Maggi, ex-governador de Mato Grosso e ex-ministro da Agricultura. O deputado Nishimori reforçou sua defesa ao projeto, afirmando que pretende modernizar a legislação.
Úlcera, corrosões na pele, câncer e cegueira
Votando contra o PL, os deputados Alessandro Molon (PSB-RJ) e Sâmia Bomfim (PSOL-SP) afirmaram que a aprovação do projeto ataca diretamente a saúde da população brasileira e o meio ambiente.
“Serão consequências irreversíveis para a população brasileira e para o meio ambiente. No governo Bolsonaro, foram registrados 1589 novos agrotóxicos, são mais de dois registrados por dias úteis. Além disso, já foram mudados regulamentos para esconder de rótulos dos agrotóxicos o grau de toxicidade. Se esse projeto de lei for aprovado, produtos que causam úlcera, corrosões na pele, câncer, cegueira não serão mais considerados extremamente tóxicos”, disse Molon durante o plenário.
O deputado Paulo Ramos (PDT-RJ), chamou o projeto de pacote do veneno. “Este é o governo da morte. Na terça-feira, manteve o veto de Bolsonaro para que os planos de saúde deixem de ser obrigados a cobrir o tratamento de pacientes com câncer. E, hoje, completa a sua covardia e interesse econômico, ao dar total liberdade para a venda de agrotóxicos que causam o câncer, ao reduzir as atribuições de órgãos como a Anvisa, Fiocruz e Ibama responsáveis pela autorização e fiscalização destes produtos”, criticou.
Inca: perigo maior para a população
O projeto prevê ainda que, no âmbito das doenças crônicas não transmissíveis e do câncer, seja feita a “análise de riscos” dos agrotóxicos ao invés da “identificação do perigo”, dando margem à autorização de produtos ainda mais nocivos à saúde e à vida. Em documento, o Instituto Nacional do Câncer (Inca) se manifestou contrário ao projeto que coloca em risco a saúde da população e o meio ambiente.
O Inca lembra que o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo e que, em dez anos, o mercado brasileiro de pesticidas cresceu 190%. “Destaca-se, porém, na literatura científica nacional e internacional, que o modelo atual de cultivo, com o intensivo uso de agrotóxicos, gera insegurança alimentar e outros malefícios, como poluição ambiental, contaminação de mananciais, do solo, do ar e intoxicação de trabalhadores rurais e da população em geral”, frisa o documento.
Acrescenta que entre os efeitos sobre a saúde humana associados à exposição aos agrotóxicos, os mais preocupantes são as intoxicações crônicas, caracterizadas por infertilidade4, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, manifestada através de distúrbios cognitivos e comportamentais e quadros de neuropatia e desregulação hormonal, ocorrendo também em adolescentes, causando impacto negativo sobre o seu crescimento e desenvolvimento dentre outros desfechos durante esse período.
Crédito: ´Fernando Frazão/Agências Brasil/Fotos Públicas
Fonte: Agência O Globo e SEEB do RJ