Às vésperas do 08 de março, Dia Internacional de Luta das Mulheres, lembramos o histórico de luta e resistência das mulheres por todo o mundo, especialmente as operárias russas que foram às ruas contra a fome, a guerra e a tirania, sendo estopim da Revolução Russa. Anos mais tarde, Clara Zetkin torna este dia a referência de luta das mulheres socialistas, no Congresso Internacional das Mulheres Socialistas em 1921, em Copenhague.
Seguimos nas ruas e as ocuparemos novamente, neste 08 de março, para reafirmar que a luta feminista e socialista segue atual e necessária. Um dos embates é contra a ideia de que o feminismo e suas reivindicações estariam superados, que as mulheres já estão no mercado de trabalho e, até mesmo, na Presidência da República. Mas o machismo e a desigualdade seguem fortes, presentes ideologicamente e deixando marcas na vida e no corpo das mulheres.
Marcas oriundas da ausência de direitos e da gradativa diminuição do Estado nos serviços essenciais, como saúde, educação, moradia e previdência social; também da dupla exploração de sua força de trabalho, com o trabalho doméstico, desqualificado e não pago. E também na ocupação dos postos mais precarizados e mal remunerados.
As mulheres são a maioria da população brasileira hoje e também são a maioria das pessoas que vivem com menos de um salário mínimo. A diferença salarial entre homens e mulheres persiste aliada ao componente étnico–racial que aumenta a desigualdade e exploração das mulheres negras. É urgente transformarmos a realidade de super exploração que as mulheres trabalhadoras estão submetidas!
A violência contra as mulheres ainda é gritante, responsável por uma realidade de medo e humilhação. Apesar da aprovação da Lei Maria da Penha, que representou um avanço jurídico importante, é preciso condições para implementação da lei com recursos e ações efetivas para combater a violência sexista. A violência contra a mulher ainda é vista como algo natural, comum e trivial.
A cobertura dada pela imprensa espetaculariza à violência e, ao mesmo tempo, reforça essa trivialidade. Além dos instrumentos legais, é preciso avançar na consciência da população, combatendo toda e qualquer expressão do machismo. Afinal, é o machismo a única causa desse tipo de violência. É a ideologia machista que vê a mulher com inferioridade, como coisa, subalterna, submissa, sem condições para fazer escolhas e participar da política, sem independência e autonomia para viver sua sexualidade e decidir acerca de seu corpo. A violência contra a mulher é o machismo em movimento, que fere e mata mulheres diuturnamente. Nossa luta é contra a violência, a banalização e o silêncio.
Lutamos também pelo Estado laico, para que os direitos e as políticas públicas não sejam ditados por interesses de grupos religiosos. Respeitamos a opção de fé de cada cidadão, inclusive a opção de não ter fé alguma. Entretanto, nos grupos religiosos, a chamada “bancada da fé”, vêm se empenhando em perseguir e criminalizar as mulheres que realizam a prática do aborto e tentam incidir sobre a legislação com diversos projetos para restringir ainda mais esta prática e com ações referentes à autonomia das mulheres sobre seu corpo. Esse grupo é poderoso e o governo Dilma segue barganhando os direitos das mulheres em troca de votos e governabilidade.
A medida provisória 557 que institui o cadastro de gestantes é um exemplo dessa política, justifica-se o controle das gestantes por meio de um cadastro nacional para, supostamente, reduzir a mortalidade materna. Não há nenhuma iniciativa concreta na área da saúde e tampouco se refere ao aborto inseguro como uma das causas da mortalidade materna. Um cadastro não resolverá um problema de saúde pública. E a lógica não pode ser do controle e criminalização, mas de educação sexual, acesso a métodos contraceptivos e aborto seguro para interrupção da gravidez indesejada. O debate e posicionamento em relação à legalização do aborto deve ocorrer pautado no debate do estado laico, da saúde pública e na defesa da vida e autonomia das mulheres. Sem hipocrisia e fundamentalismos.
No atual governo, também, ocorreram muitas remoções devido às obras destinadas à Copa do Mundo de 2014. As mulheres – principalmente mulheres negras – são parte da sociedade que mais sofrem com essas remoções. Essas mulheres da periferia, na maioria das vezes, são as responsáveis pela chefia de famílias, pelo cuidado com a moradia e com as crianças. A mudança repentina de moradia altera o cotidiano dessas mulheres. Uma das consequências pode ser o aumento da carga de trabalho (com péssima remuneração), trazendo novas preocupações e encargos com filhos e filhas. O aumento da prostituição, inclusive da prostituição infantil para atender o turismo sexual, também é uma realidade vinculada à copa do mundo que agrava a situação de muitas mulheres.
Outro exemplo é o estatuto do nascituro. O Projeto de Lei 478 traz um retrocesso para o direito reprodutivo e para a vida das mulheres! Este projeto anula o aborto legal presente em nossa Constituição atual, ou seja, quando é diagnosticada a anencefalia fetal (nesses casos o bebê não vive fora do útero e os riscos para a vida da mulher que segue gestante são altíssimos) e em casos de estupro. Segundo o projeto de lei a mulher será criminalizada se abortar – ainda que seja uma gestação provocada por um estupro! Para piorar, o estuprador poderá reconhecer a paternidade e ter seu nome na certidão de nascimento da criança.
Este modelo reforça a violência contra as mulheres, reforça a ideia de que o estuprador pode ser pai por meio do pagamento de uma pensão, sugere o estupro como caminho para a paternidade (o que é inaceitável!) e desconsidera que a reprodução é uma escolha da mulher. Quando o estuprador não for identificado, a pensão será assumida pelo Estado – que deveria ser laico e, portanto, zelar pela vida das mulheres, como pela vida de qualquer cidadão. Chamamos esta pensão de “bolsa-estupro”. O estatuto do nascituro contribui, então, para o fortalecimento de uma cultura estabelecida de submissão das mulheres em relação aos homens.
Assim, temos muito a reivindicar e estamos nas ruas para dizer que sem feminismo não há transformação dessa sociedade. Não há luta por liberdade, por justiça, por uma sociedade socialista se as mulheres seguem exploradas e oprimidas. Tomemos as ruas no 08 de março, por socialismo e liberdade!
Fonte: Essas Mulheres Trabalhadoras da Intersindical