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10 fatores que fazem boatos sem fundamento sobre eleições viralizarem

28 de outubro de 2022

Boatos e desinformação que colocam à prova a confiabilidade do sistema eleitoral não são um fenômeno novo, mas têm causado cada vez mais preocupação

Após o primeiro turno das eleições presidenciais, voltaram a circular nas redes sociais postagens que denunciam a anulação de 7,2 milhões de votos pelas urnas eletrônicas. Trata-se de um conteúdo enganoso, que já havia sido compartilhado em 2018, e vem sendo usado novamente às vésperas de um dos pleitos mais polarizados da história recente do Brasil.

 

A narrativa já foi desmentida publicamente — o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) disponibiliza os dados da apuração e apenas os próprios eleitores podem anular votos, seja por erro ou vontade consciente —, mas antes de ser verificada causou muitas dúvidas e apreensão entre os brasileiros.

 

Boatos e desinformação que colocam à prova a confiabilidade do sistema eleitoral não são um fenômeno novo, mas têm causado cada vez mais preocupação entre estudiosos, jornalistas e autoridades eleitorais, segundo um grupo de pesquisadores americanos que estuda o assunto.

 

Um relatório produzido pela chamada Election Integrity Partnership (Parceria de Integridade Eleitoral, em tradução livre), uma coalizão não partidária liderada pelo Observatório da Internet da Universidade de Stanford Internet e pelo Centro para o Público Informado da Universidade de Washington, identificou os fatores mais determinantes para que esse tipo de boato viralize no ambiente online.

 

A análise foi conduzida por ocasião das eleições de meio de mandato que serão realizadas nos Estados Unidos em novembro de 2022, mas suas conclusões também se aplicam ao contexto eleitoral brasileiro.

 

Segundo os pesquisadores, esse tipo de conhecimento pode ajudar a antecipar quais boatos serão disseminados, assim como seu potencial para viralizar.

 

“Muitos boatos viralizam antes mesmo que a verdade sobre eles possa ser verificada, o que pode minar a confiança da população no processo democrático das eleições”, afirmou à BBC News Brasil Renée DiResta, gerente de pesquisa do Observatório da Internet de Stanford e uma das pesquisadoras envolvidas no relatório.

 

“Os boatos não se restringem a temas políticos, vimos muitas teorias que se provaram falsas serem disseminadas sobre a covid-19, por exemplo. Mas de qualquer maneira, eles representam um grande desafio para aqueles cujo trabalho é informar o público.”

 

Segundo a pesquisadora, diferente da desinformação, que é criada com a intenção de manipular, os boatos muitas vezes surgem em ambientes instáveis e podem se provar falsos ou não – no caso brasileiro, a grande maioria dos conteúdos difundidos nas redes sobre o sistema eleitoral e as urnas eletrônicas é enganosa.

 

“Boatos podem também ser disseminados por governos ou autoridades e, nesse caso, cabe a outras fontes de informações confiáveis, como a imprensa e organizações comunitárias, checá-los e desmenti-los quando necessário”, diz DiResta.

 

Confira a seguir quais são os principais fatores que impulsionam os boatos sobre processos eleitorais, segundo a análise da Election Integrity Partnership. O estudo reuniu diferentes dissertações e pesquisas anteriores para elaborar a lista de dez itens.

 

1- Incerteza ou ambiguidade

Segundo os pesquisadores responsáveis pela análise, a incerteza é um fator chave para a disseminação de boatos.

 

Em momentos incertos e ambíguos, como por exemplo períodos de crise política ou até durante a apuração das urnas em uma eleição, informações pouco confiáveis tendem a ganhar mais tração diante da busca da população por respostas e um entendimento do que está acontecendo.

 

De acordo com o relatório, à medida que as pessoas tentam elaborar teorias e explicações, surgem os boatos.

 

“Esses rumores são inicialmente infundados – ou seja, eles podem se provar verdadeiros, falsos ou algo intermediário. Boatos falsos, especialmente no contexto eleitoral, podem ter efeitos nocivos”, dizem os pesquisadores.

 

2- Desconfiança em relação à imprensa

“Em ambientes informacionais onde as fontes oficiais não são vistas como confiáveis, seja devido a suas próprias falhas ou esforços de má-fé para minar a confiança (ou uma combinação dos dois), os boatos são mais propensos a se espalhar”, diz o estudo, que classifica como fontes oficiais a imprensa tradicional e membros do governo.

 

Segundo os pesquisadores, a ausência de informações divulgadas por essas fontes, especialmente em cidades menores e áreas rurais, também pode levar à difusão dos boatos.

 

Para Renée DiResta, o melhor remédio para evitar que boatos falsos se espalhem é justamente fortalecer a comunicação entre as fontes oficiais e o público.

 

“Mesmo que a verdade sobre aquele fato ainda não seja 100% conhecida, as autoridades precisam se dirigir a população para, pelo menos, dizer que estão investigando. Não falar nada pode impulsionar os boatos”, diz.

 

3- Impacto

Um terceiro fator importante é a relevância do tema ou dos supostos resultados do boato para as pessoas.

 

“As pessoas são mais propensas a se envolver com boatos que são relevantes para elas – que têm impacto potencial, positivo ou negativo, em suas vidas”, diz a análise elaborada pelos especialistas da Election Integrity Partnership.

 

De acordo com os pesquisadores, a ansiedade gerada por uma situação ou pelas informações difundidas também influenciam a força de um boato, assim como a atenção dada ao tema pela sociedade em geral.

 

4- Familiaridade e repetição

Segundo os pesquisadores, a familiaridade com o tema, que pode ser criada e reforçada por meio da repetição, também influencia a capacidade de um boato viralizar.

 

O relatório cita um fenômeno denominado “efeito de verdade ilusória”, elaborado por três pesquisadores na década de 1970, que afirma que a mera repetição de informações é suficiente para aumentar sua aceitação.

 

E muitas vezes, boatos novos recuperam elementos de casos bem-sucedidos anteriores para dar uma sensação de plausibilidade. De acordo com os especialistas, novos boatos geralmente se baseiam em “modelos narrativos” que são reciclados à medida que novos eventos se desenrolam.

 

O relatório cita como exemplos de narrativas que se repetem constantemente boatos de cédulas eleitorais descartadas, urnas manipuladas ou eleitores já falecidos registrados para votar.

 

5- A força da “evidência”

Outro fator citado pelos pesquisadores é a presença de algum tipo de “evidência” que torna a alegação mais tangível – por exemplo, um vídeo de câmeras de segurança, uma imagem de uma urna com defeito, prints de resultados eleitorais incorretos ou experiências pessoais de eleitores.

 

O relatório alerta, porém, que essas supostas evidências podem ser fabricadas, deliberadamente tiradas do contexto ou mal interpretadas.

 

Os pesquisadores também explicam que a forma como as evidências são reveladas influencia a capacidade do boato viralizar. Relatos em primeira pessoa, por exemplo, tendem a ser mais convincentes.

 

E a partir do momento que são estabelecidos, os boatos podem ser compartilhados por meio da repetição orgânica e coordenada, ganhando novas evidências e sendo moldados a partir das necessidades e preocupações da comunidade.

 

Segundo o pesquisador francês Jean-Noel Kapferer, boatos bem detalhados são comuns na política e, muitas vezes, eles viralizam antes que o alvo das alegações possa responder ou se defender.

 

6- Apelo emocional

Parte significativa da força que os boatos têm para viralizar é atribuída à sua capacidade de gerar respostas emotivas. Segundo os pesquisadores responsáveis pelo relatório, o apelo emocional incentiva o compartilhamento, especialmente no ambiente online.

 

Qualquer tipo de emoção pode ajudar na disseminação de um boato, até mesmo o riso – segundo o estudo, o humor também incentiva o compartilhamento.

 

Também de acordo com os pesquisadores, boatos eleitorais que fazem acusações contra indivíduos ou grupos específicos (como, por exemplo, mesários, juízes, policiais ou membros de um partido político) e evocam sentimentos de raiva ou desgosto têm o potencial de se espalhar amplamente entre pessoas que compartilham determinadas identidades demográficas ou políticas.

 

7- Novidade

Outro fator chave é a novidade: quanto mais nova e inusitada a informação, maiores são as chances dela se espalhar de forma maciça e veloz.

 

Pesquisas recentes mostram, inclusive, que notícias falsas se disseminam mais e mais rápido do que notícias verdadeiras, em parte, devido a suas qualidades “sensacionais”.

 

Especialistas teorizam que a explicação para essa tendência pode estar nos ganhos sociais e de reputação associados ao compartilhamento de informações novas e valiosas.

 

O relatório admite que os fatores novidade e familiaridade podem parecer conflitantes entre si. No entanto, explica que os boatos com maior potencial de disseminação terão tanto elementos familiares que já deram certo no passado quanto componentes novos.

 

8- Potencial participativo

Segundo o estudo, boatos são participativos, especialmente aqueles relacionados à política. E quanto mais possibilidade de envolvimento, maiores as chances de a narrativa se espalhar.

 

E compartilhá-los é apenas uma maneira de participar: fazer acréscimos, dar novas interpretações à história ou resumir os fatos são outras formas.

 

9- Redes de contato

Boatos se espalham através de redes de contatos, tanto online quanto offline – e a estrutura dessas redes determina sua capacidade de disseminação.

 

Histórias que começam em contas com poucos seguidores nas redes sociais, por exemplo, podem ter mais dificuldade de viralizar do que aquelas compartilhadas por pessoas de influência, como políticos, jornalistas, celebridades e influencers.

 

Mas segundo os especialistas, mesmo os boatos que surgem em comunidades ou contas pequenas podem ganhar tração ao serem compartilhados posteriormente por um agente influente.

 

Além disso, as histórias podem obter força adicional quando pulam de uma comunidade para outra, seja em um contexto online ou offline.

 

10- Manipulação das redes sociais

O último fator destacado pela análise são as estratégias de disseminação de boatos, tais como o uso dos algoritmos das redes sociais e a criação de bots, que por vezes manipulam o processo natural de difusão.

 

Embora as empresas de redes sociais se esforcem para resolver algumas dessas vulnerabilidades, ainda existem muitas técnicas usadas para ampliar a tração e viralizar postagens específicas.

 

Os pesquisadores ressaltam ainda que boatos produzidos ou captados de forma oportunista por atores que empregam essas técnicas (ou se beneficiam do uso delas para construir grandes redes se seguidores) provavelmente se disseminarão mais rapidamente.

Crédito: TSE
Fonte: BBC News Brasil em São Paulo
Escrito por: Julia Braun

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Publicado por: Gustavo Mesquita

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